Cristãos podem tomar antidepressivos?

Russell Moore
Russell Moore

Caro Dr. Moore,

Há algum tempo, meu médico me diagnosticou com uma forma (relativamente) moderada de depressão. Ele receitou um anti-depressivo. Eu odeio os efeitos colaterais, e não gosto de como eles fazem me sentir, mas talvez eu me acostume. Meu maior problema é saber se um cristão deveria tomar esse tipo de remédio, pra início de conversa. Se eu tenho o Espírito Santo, por que precisaria de remédios? É eticamente aceitável um cristão tomar esse tipo de medicamento?

Confusa

Cara confusa,

Antes de qualquer coisa, você está certa ao buscar ajuda médica. Depressão não é algo simplesmente desagradável; é, possivelmente, debilitante e perigoso, além de um sintoma de que algo está errado. Aqui vão algumas coisas para você refletir.

Deus nos criou como pessoas completas, com um corpo e uma psique em sintonia. O corpo afeta o psicológico. Ficar sem comer, por exemplo, ou sem dormir, muda dramaticamente a forma como alguém pensa ou se sente. E o psicológico afeta o corpo. Nós não “temos” um corpo ou “temos” uma psique. Somos pessoas psicossomaticamente completas, feitas à imagem de Deus.

Faz sentido pra mim que fatores biológicos e psicológicos muitas vezes façam com que as pessoas não vejam a realidade corretamente. Alguns medicamentos podem “consertar” algo que está errado. Por exemplo, um tireóide desregulada pode ser corrigida com o auxílio de medicamentos sintéticos que levam o corpo a fazer o que foi criado para fazer. A maioria dos antidepressivos que você vê anunciados na televisão não “consertam” algo, mas apenas disfarçam os sintomas. Eles rearranjam os níveis dos receptores de serotonina ou dopamina, por exemplo, para que a pessoa não experimente certos níveis de tristeza, tédio ou desespero.

Às vezes, quando a depressão ou a ansiedade é causada por razões não-psicológicas, a pessoa fica em uma situação tão prejudicial que a medicação é necessária para começar a realizar um tratamento. Mas, lembre-se, para a maioria das pessoas, não há medicamento que resolva o problema psicológico. O que o medicamento faz é “anestesiar” a pessoa da dor da depressão e da ansiedade.

Anestesia, quando parte de um plano maior, pode ser uma coisa boa. Quando eu tenho uma dor de dente, eu quero que meu dentista me dê um anestésico para acabar com o incômodo. Antes que o dente possa ser consertado, alguém precisa “desligar” temporariamente a minha agonia. Mas um dentista que simplesmente “trata” meu dente infeccionado com analgésicos não está me ajudando. No fim das contas, o dente precisa ser consertado.

Pode ser que a sua depressão e ansiedade sejam causadas por algo psicológico. Se for o caso, continue seu tratamento médico, e procure a causa do problema. Mas pode ser que haja outras razões para a tristeza e a ansiedade. Talvez você tenha perdido um cônjuge recentemente, o emprego ou um amigo. Se esse é o seu caso, não deixe de chorar pela perda. Talvez você esteja ansiosa por causa de uma consciência pesada ou incertezas sobre o futuro. Não trate essa ansiedade simplesmente com remédios. Lembre-se do evangelho, ore, sozinha e com outras pessoas, e busque o tipo de conselho que pode trazer as mudanças de vida necessárias para lidar com o que quer que seja que esteja te deixando tão desesperada.

E, independente da causa da sua depressão ser fisiológica ou circunstancial, também é importante, creio eu, ter uma imagem realista do que o “normal” é, de como se parece o seu alvo. Eu sei que eu tenho problemas em enxergar isso, às vezes.

A vida “normal” não é aquela anunciada nas propagandas pela indústria farmacêutica ou aquelas que vemos nos filmes ou, sinceramente, em muitos sermões cristãos e músicas de adoração. A vida “normal” é a vida de Jesus de Nazaré, que resume em si mesmo tudo o que significa ser humano (Efésios 1.10). E a vida de Cristo apresentada a nós nos evangelhos é uma vida de alegria, de comunhão, celebração, mas também de solidão, de profunda tristeza, lamentos, pesar, ira e sofrimento, e tudo isso sem pecar.

Conforme o Espírito Santo nos molda à imagem de Cristo, nós não nos tornamos anestesiados ou, muito menos, sem emoções. Pelo contrário, a Bíblia nos diz que gememos, em conjunto com a criação ao nosso redor (Romanos 8.23). Nós clamamos com o próprio Jesus ao experimentar a agonia do Getsêmani (Gálatas 4.6; Marcos 14.36). E, paradoxalmente, nesse mesmo caminho, nós nos unimos a Jesus na alegria e na paz (Gálatas 5.22). A vida emocional do ser humano é complicada, e a vida emocional de um ser humano regenerado é complicada também.

Se seus médicos querem que você alcance esse tipo de experiência emocional, tudo bem. Mas se você está esperando um tipo de tranquilidade emocional constante, você talvez esteja buscando algo que está além da própria condição humana.

Há alguns cristãos que acreditam que qualquer remédio psiquiátrico é uma rejeição espiritual da autoridade bíblica. Eu não sou um deles. Mas há outros cristãos que parecem pensar, juntamente com a nossa cultura, que tudo é material e pode ser resolvido por meios materiais. Eu não acredito nisso também.

Continue a trabalhar com seus médicos para tratar essa depressão. Se você não está feliz com o tratamento ou com os efeitos colaterais, busque outras opiniões médicas e conselhos de pessoas mais sábias. Como você mesmo coloca na questão, às vezes os efeitos são terríveis. Fale com seu médico, e se informe para fazer as perguntas certas.

Mas também gaste tempo com pessoas que te conhecem e que te amam, e tente descobrir se há mais causas para isso do que simplesmente falha na recepção de serotonina. Deus não quer que você esteja simplesmente, nas palavras de um observador da busca farmacêutica por utopia, “confortavelmente confortável”. Ele quer que você seja completa.