O Evangelho da glória: o que faz da Boa Nova boa nova

Mike Riccardi
Mike Riccardi

Em 2 Coríntios 4.4, Paulo define morte espiritual como cegueira para a glória. Já analisamos a prescrição de Deus para a cegueira. No exercício soberano da Sua vontade, Deus resplandece em nosso corações para dar a luz do conhecimento da glória na face de Cristo. Ele supera nossa resistência ao Evangelho – causada por nossa cegueira para a glória – ao nos dar a luz necessária para ver as coisas como elas realmente são. Esse é o milagre da regeneração.

 O nível mais profundo da obra redentiva de Deus

Junto com o entendimento dessa prescrição soberana, observamos que em 2 Co 4.4 e 4.6 Paulo descreve três níveis da obra redentiva de Deus, e à medida que progredimos por cada nível chegamos a uma maior profundidade e maior ultimidade na obra salvadora de Deus. Deus resplandeceu em nossos corações para dar a Luz (esse é o nível 1) do conhecimento,  do evangelho (esse é o nível 2), da glória de Deus na face de Cristo (esse é nível 3). Esse é o nível mais profundo da obra redentiva de Deus. É para isso que nossos olhos estão abertos para ver. A salvação diz respeito a isso!

Você consegue ver essa verdade no texto? Paulo chama o evangelho de “evangelho da glória de Deus na face de Cristo”. E a Escritura, frequentemente, fala da salvação nesses termos. Hebreus 2.10 descreve o ministério da salvação de Jesus como “conduzindo muitos filhos à glória”. 1 Pedro 3.18 diz que Cristo morreu, uma única vez, o justo pelos injustos, para conduzir-vos a Deus. E 2Ts 2.13-14 fala de uma maneira chocantemente clara: “Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé na verdade, para o que também vos chamou mediante o nosso evangelho, para alcançardes a glória de nosso Senhor Jesus Cristo”.

Você entende isso? O evangelho é o meio pelo qual você receberá a glória de Cristo. Nosso evangelho é o evangelho da glória. Isso significa que o que a Boa Nova consiste na – aquilo sobre o qual o evangelho diz respeito – glória de Deus em Cristo. Ver e se alegrar na glória de Deus na face de Cristo é o que faz da Boa Nova boa nova.

Sou muito grato pela forte ênfase que está sendo posta sobre a centralidade do evangelho no evangelismo conservador contemporâneo. Não é incomum ouvir a glória do evangelho celebrada em muitos púlpitos. No entanto, espero que aqueles que rapidamente se identificam como centrados no evangelho percebam que o evangelho é centrado na glória. Podemos (e devemos!) amar a glória do evangelho. Mas precisamos reconhecer que o evangelho é o evangelho da glória. E, portanto, quando pregamos o evangelho, devemos fazê-lo de maneira consistente com o fato de que aquilo que faz da Boa Nova boa nova é que, finalmente, podemos ver e nos alegrar na glória de Deus revelada na face de Cristo.

As Escrituras não param no nível dois

Infelizmente, muitas das apresentações do evangelho que ouço param no nível dois. Muitos cristãos pregam o evangelho como se o homem fosse o objetivo final na salvação. Eles dizem às pessoas que Jesus morreu por elas e, então, eles param aqui. Como se a Boa Nova fosse que Deus simplesmente nos amou tanto que Ele não podia viver sem nós e, então, Ele morreu para ficar conosco. Mas você consegue perceber o quanto isso nos enfatiza? O problema é que isso não é o que o amor de Deus faz. O amor de Deus expresso no Seu resplandecer da Luz da vida dentro de nossos corações mortos não foi para que pudéssemos olhar para a cruz e ver nosso valor, mas para que pudéssemos finalmente ver e nos alegrar no Seu valor. Não somos o objetivo final de Deus na salvação. O evangelho é o evangelho da glória. No final das contas, a razão pela qual Deus salva qualquer pecador é para manifestar Sua própria glória.

Ouça o que a Escritura diz sobre a motivação de Deus, Seu objetivo, ao salvar pecadores:

  • Isaías 43.25 – “Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim.”
  • Ezequiel 36.22 – “Não é por amor de vós que eu faço isto, ó casa de Israel, mas pelo meu santo nome, que profanastes entre as nações para onde fostes.”
  • Tito 2.14 – Cristo “a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu.”
  • E na seção de abertura em Efésios 1, Paulo diz três vezes que a salvação é planejada para o louvor da glória de Deus (Ef 1.6, 12, 14).

Uma centralidade em Deus que é na verdade uma centralidade no homem

Claro, poucos cristãos vão negar isso; muitas pessoas contentemente confessarão que devemos ser centrados em Deus. O problema é que elas podem estar contentes em serem centrados em Deus porque realmente acreditam que Deus é centrado no homem. Então, a centralidade delas em Deus é na verdade uma centralidade no homem. Elas dizem que a alegria delas está em Deus, mas a alegria delas está realmente nelas próprias. Elas alegram-se em adorar Deus apenas quando Deus os adora.

No entanto, o amor de Deus apresentado no Evangelho não tem o sentido de que Ele nos valoriza! O amor de Deus apresentado no Evangelho significa que Ele resplandece Luz que cura nossa cegueira à glória, e, assim, nos liberta do nosso caso de amor com o pecado para que – em vez de somente sermos capaz de estarmos satisfeitos em sermos engrandecidos – possamos estar inteiramente satisfeitos no profundo das nossas almas ao engrandecê-Lo para sempre. Somos livres para encontrar nossa alegria na exaltação de Outro.

Sim, Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu o seu Filho unigênito. Mas termine a sentença! Ele fez isso com um propósito: para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha vida eterna. E o que é vida eterna? João 17.3: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste.” O objetivo de Deus ao enviar Cristo não era para mostrar à humanidade quão valiosos éramos; Seu objetivo era nos dar olhos para ver quão valioso Ele é. Ele resplandeceu em nossos corações para dar a Luz do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo.

O amor de Deus para nós não é primeiramente para nós, mas para Ele mesmo.

No entanto, já que muitas pessoas têm absorvido a definição distorcida de amor da nossa cultura (valorizar muito algo ou alguém), muitas pessoas – talvez alguns de vocês que estão lendo isso – tenham dificuldade em sentirem-se amados quando ouvirem que Deus os ama por amor dEle mesmo. No entanto, amar alguém não é fazê-lo se sentir bem acerca de si mesmo. Amar alguém é fazer o que é melhor para ele. E o que é melhor para mim, e melhor para você – o que vai mais satisfazer nossas almas e nos dar verdadeira e permanente alegria – é ver a glória de Deus pela qual fomos feitos. A autoexaltação de Deus não é arrogância, mas amor.

E há uma fartura de satisfação em sentir-se amado dessa maneira. Sinto-me tão seguro, tão protegido, tão amado pelo fato de que eu não venho em primeiro lugar nas afeições de Deus, mas Ele que vem. Como não sou a base da minha segurança, Ele é. Na verdade, nunca vamos entender a doce plenitude do que significa ser amado por Deus – nunca vamos saber a largura, o comprimento, a altura e a profundidade desse amor que excede o entendimento (Ef 3.18-19) – até entendermos que o amor de Deus para nós não é primeiro a nós, mas a Ele mesmo.

John Piper prega que: “Deus ama Sua glória mais do que Ele nos ama e…essa é a fundação do Seu amor para nós” (Irmãos, não somos profissionais, 7). Porque é no amor a Si mesmo,  no louvor a Si mesmo, na manifestação de Si mesmo, que você e eu podemos ver e se alegrar na única coisa que pode realmente satisfazer nosso coração: a glória de Deus na face de Cristo.

Conclusão

A Boa Nova não é apenas que Jesus morreu por nós. A Boa Nova é que Jesus morreu por nós para nos trazer a Deus (1 Pe 3.18). A Boa Nova não é apenas que Deus deu Seu Filho amado a nós. A Boa Nova é que Deus deu Seu Filho amado a nós para nos dar uma eternidade de visão, conhecimento, amor e louvor a Ele. O trabalho amoroso e expiatório de Cristo no evangelho é um meio para o grande fim: que o povo que Deus criou finalmente O glorificaria ao desfrutar e ser satisfeito na Sua glória – a glória pela qual eles foram criados (Is 43.7)

Que nunca esqueçamos que o evangelho que proclamamos é o evangelho da glória.