Zumbis e o Evangelho

Russell Moore

Uma vez por ano, na cidade onde eu moro agora, há o que é conhecido como um “Zombie Walk“. Nesta noite, as pessoas (normalmente jovens moradores da cidade) se vestem como os “mortos vivos” da tradição de horror e arrastam-se com as mãos estendidas, gemendo, como um enxame, juntos, pelas ruas da cidade. Um jovem cristão que viu isso me disse que era a coisa mais próxima do que ele imaginava ser o inferno.

Eu pensei sobre os “zombie walkers” nesta manhã, enquanto lia um artigo do autor Chuck Klosterman, no New York Times, sobre a  razão de os zumbis darem a volta por cima na cultura popular americana. Klosterman argumenta que as histórias de zumbis representam, para muitos americanos contemporâneos, “alegorias para como eles percebem a sua existência no dia-a-dia.”

A grande verdade sobre zumbis, ele argumenta, é que mesmo mortos como eles são, eles continuam vindo. Assim que você “mata” um homem morto, há outro logo atrás dele. “Em outras palavras, matar zumbis é filosoficamente semelhante a ler e eliminar 400 e-mails de trabalho em uma manhã de segunda-feira, ou preencher uma papelada que só gera mais papelada, ou seguir fofocas de Twitter por obrigação, ou realizar tarefas tediosas em que o único risco real é ser consumido pela avalanche”.

Claramente, há algo sobre os zumbis que ressoa com a imaginação popular atual. Não são apenas zumbis retornando em filme de terror, mas eles estão por toda parte na ficção popular, desde romances de guerra apocalíptica de zumbis até as adaptações dos clássicos da ficção com os mortos-vivos (“Orgulho e Preconceito e Zumbis“, baseado na obra “Orgulho e Preconceito”, de Jane Austen, é um exemplo). O próximo lançamento dos jogos de vídeo game terá Richard Nixon, entre várias pessoas, como um caçador de zumbis.

Eu acho que há mais do que cenário sobrecarregado descrito por Klosterman. O zumbi representa o que significa sentir-se morto-vivo e, ainda assim, incapaz de parar. Isso é, no fundo, uma condição espiritual, antes de ser sociológica.

Aqueles familiarizados com a história cristã sabem que o pecado humano original trouxe uma sentença de morte. O que muitas vezes não se nota é que essa pena de morte foi radicalmente graciosa. Após se juntar à serpente em sua rebelião contra Deus, o homem e a mulher estavam espiritualmente separados da vida com Deus. Eles foram mortos. Deus os exilou fora do Jardim do Éden não porque ele era maldoso com eles, mas para levá-los para longe do meio designado para manter as suas vidas, a Árvore da Vida. Deus enviou a humanidade pecadora para fora do santuário já que “não se deve, pois, permitir que ele tome também do fruto da árvore da vida e o coma, e viva para sempre” (Gênesis 3.22).

Afastados da árvore da vida, a rebelião de Adão e Eva terminaria finalmente em morte. Com o passar de cada geração de pecadores, havia a esperança de um novo começo, um recomeço que viria definitivamente quando uma nova raiz da vida humana surgiu, o Filho nascido de uma virgem, Filho de Eva.

Ao longo da história bíblica, porém, existem aqueles que acham que a morte é o único problema. Os Evangelhos nos falam, por exemplo, daqueles que perguntam a Jesus sobre como a “herdar a vida eterna” (Mateus 19.16; Lucas 10.25). Jesus responde apontando o caminho para a vida. Muitas vezes, deixando seus interlocutores perplexos e decepcionados (Mt 19:21-22; Lc 10:37).

Zumbi do seriado, "The Walking Dead".

Essa é a grande questão de todo o evangelho. A boa notícia não é apenas o fugir do fim da existência. Pior que isso é uma vida em curso presa em morte espiritual. Isso não é vida. Viver como uma criatura morta, dirigida por desejos demoníacos (Ef 2:1-3) é mais parecido com um zumbi do que a vida abundante prometida no evangelho. Afinal, em nosso pecado, é isso que nós éramos: cadáveres ambulantes que viviam apenas para alimentar nossos apetites.

Talvez por isso tão poucos são persuadidos pelos nossos apelos para a vida eterna. Para alguns, a própria ideia de vida eterna é a coisa mais desanimadora a se imaginar. E por boas razões. Eles são, como nós estávamos, o mortos-vivos. O evangelho é a promessa da vida eterna, mas só depois da promessa da morte.

Em Cristo, somos, crucificados e sepultados. Nosso corpo morto-vivo é finalmente posto para descansar. E então, em Cristo, somos elevados, não apenas à continuação da vida, mas à “vida nova” (Romanos 6.4), para uma “nova criação” (2 Coríntios 5.17).

Na próxima vez que você vir um romance de zumbis na prateleira da livraria, ou na próxima vez que você passar por um anúncio de algum filme de zumbis sangrentos, pare e ore por aqueles que se sentem como mortos-vivos.

E lembre-se que esta já foi a sua história de vida. Você estava morto para a fonte da vida. Você estava andando por uma força motriz que te consumia mais e mais, e que nunca poderia dar-lhe vida. E não havia fim à vista. “Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, quando ainda estávamos mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo” (Efésios 2.5).

Tradução: Rafael Bello| iprodigo.com| original aqui