A respeito da união hipostática, na qual um Cristo é Deus e homem, J.C. Ryle escreveu: “Deveríamos estabelecer isso firmemente em nossas mentes, que nosso Salvador é perfeito homem assim como perfeito Deus e perfeito Deus assim como perfeito homem. Se perdermos de vista esta grande verdade basilar, podemos nos aventurar em temíveis heresias”.
Nessa preciosa união, o Filho de Deus assumiu nossa natureza humana em Sua divindade, embora Deus tenha permanecido Deus e o homem permanecesse homem nEle. Consequentemente, Ele não se tornou duas pessoas, mas permaneceu uma Pessoa divina – o Filho de Deus, a Segunda Pessoa na santa Trindade. Cristo assumiu uma natureza humana para Si, mas nunca tornou-se uma “pessoa humana”. Assim, devemos ser cuidadosos quando falarmos de Jesus como o Deus-homem, enfatizando que Ele não se tornou duas pessoas.
Por toda a história da igreja, tem havido numerosos erros que se desenvolveram contra essa doutrinas, tais como aqueles dos gnósticos, arianos, socinianos, assim como as modernas Testemunhas de Jeová. O antigo Concílio de Calcedônia (451 d.C.) corrigiu diversas doutrinas heréticas a respeito da essência do relacionamento das naturezas de Cristo. Eles direcionaram sua confissão contra certos grupos. Contra os eutiquianos, o Concílio afirmou que as naturezas de Cristo eram sem mistura e sem mudança. Contra os nestorianos, eles afirmaram que as naturezas de Cristo eram sem divisão e sem separação. Cristo não tinha duas identidades mas uma estrita unidade em uma Pessoa.
A Confissão Belga também afirmou a união hipostática claramente: “Cremos que, por esta concepção, a pessoa do Filho está unida e conjugada inseparavelmente, com a natureza humana1. Não há, então, dois filhos de Deus, nem duas pessoas, mas duas naturezas, unidas numa só pessoa, mantendo cada uma delas suas características distintas” (Artigo 19).
Uma vez que a divindade de Cristo assumiu a humanidade, Suas duas naturezas nunca estão separadas. Elas nunca estiveram separadas durante Sua vida ou depois de sua morte, nem elas estarão separadas no futuro. A Confissão Belga continua: “Estas duas naturezas, porém, estão unidas numa só pessoa de tal maneira que nem por sua morte foram separadas. Ao morrer, Ele entregou, então, nas mãos de seu Pai um verdadeiro Espírito humano, que saiu de seu corpo, entretanto, a natureza divina sempre continuou unida a humana, mesmo quando Ele jazia no sepulcro. A divindade não cessou de estar nEle, assim como estava nEle quando era criança, embora, por algum tempo, não se tivesse manifestado” (Artigo 19).
Hoje, muitos cristãos têm dificuldade em aplicar proveitosamente esse verdade para si mesmos. Mas a união das naturezas de Cristo em uma Pessoa deveria ser muito doce para a alma do cristão visto que a união hipostática garante a união mística do crente com Cristo.
Vários puritanos fizeram paralelos entre a união hipostática e a união mística de Cristo e o crente. Thomas Watson observou que a natureza humana assumida por Cristo corresponde à “sagrada união” de Sua pessoa com o crente. Ele notou, contudo, que “se não há nada além dessa união natural [hipostática], ela trará pouco conforto”. Thomas Cole, em seu Discourse of Regeneration [Discurso sobre a Regeneração], também observou: “A Natureza Humana de Cristo [na união hipostática] é o fundamento de toda a nossa comunhão com Deus: nosso acesso a Deus é por meio do véu de sua carne”. Isaac Ambrose escreveu: “Aprouve a Deus assumir e unir nossa natureza humana à deidade”, e, semelhantemente: “Aprouve a Deus unir a pessoa de cada crente ao Filho de Deus”. Edward Reynolds e John Bunyan escreveram coisas semelhantes.
Mas Thomas Manton explicou com detalhes. Ele distinguiu várias analogias entre a união hipostática e a união mística do crente com Cristo. Aqui estão cinco:
- “Na união hipostática, nossa natureza está unida à natureza de Cristo; na união mística, nossa pessoa com sua pessoa”.
- “Na união hipostática, Cristo uniu-se à nossa família; na união mística, a alma é a noiva… Assim, Cristo primeiro honrou nossa natureza e, então, nossas pessoas; primeiro, ele assumiu nossa natureza e, então, desposou nossas pessoas”.
- “Na união hipostática, Cristo era uma pessoa antes que assumisse a natureza humana; [e portanto] o corpo é um instrumento passivo… na união mística, a parte de Cristo é ativa, a nossa passiva”.
- “A união hipostática é indissolúvel; nunca foi deixada de lado, nem na morte…. Da mesma forma é a união mística; e nós nunca seremos separados”.
- “Pela união hipostática, Cristo é feito nosso irmão, ele obteve afinidade com a natureza humana; pela união mística ele é feito nosso cabeça e marido, ele casou-se com nossas pessoas”.
Verdadeiramente, para o cristão, como Manton conclui, “a união hipostática é a base de toda essa graça e glória que foi conferida à natureza humana, sem a qual, como mera criatura, ela não seria capaz de tal exaltação; assim, a união mística é o fundamento de toda essa graça e glória que recebemos”.
Para ler mais sobre os Puritanos neste assunto, veja:
- Isaac Ambrose, Looking unto Jesus em Works, 215.
- Edwards Reynolds, Joy in the Land: Opened in a Sermon Preached at Pauls, 6 de Maio (London 1655), 9.
- John Bunyan, em Richard L. Greaves, John Bunyan: Miscellaneous Works (Oxford, 1979), 8:84.
- Thomas Cole, A Discourse of Regeneration, 1969, 137.
- Thomas Manton, Vol. 11 de Works, 35ss.