Não deveria ser “cuidado com a sua má reputação”? A Bíblia não fala da importância de se ter uma boa reputação? Em Provérbios 22.1, lemos que “a boa reputação vale mais que grandes riquezas”. Em Atos 6.3 a boa reputação foi um dos critérios para a escolha dos sete diáconos, e Paulo, em sua primeira carta a Timóteo, coloca a boa reputação perante os de fora como um requisito para alguém que deseja ser bispo (1 Tm 3.7). Cuidado com a boa reputação?
Bom, certamente a má reputação tem seus problemas. Geralmente ela indica um testemunho ruim de Cristo. Se boa parte das pessoas tem um conceito ruim sobre mim, eu faria bem em me examinar, me arrepender do que for necessário e clamar pela ajuda de Deus para mudar, pois pode ser que elas estejam certas em sua opinião sobre mim. Mas a boa reputação também traz seus problemas espirituais. Não que seja ruim tê-la, pelo contrário, é esperado que cristãos tenham uma boa reputação. É desejável. Mas a questão é: como lidamos com nossa reputação?
A prisão
Se você é cristão há algum tempo, é muito provável que você tenha uma boa reputação. As pessoas de onde você estuda ou trabalha, seus familiares e os cristãos de sua igreja, de alguma forma, lhe admiram. A transformação que o Espírito Santo tem feito em sua vida atrai a atenção de outros. E aí o problema começa. A imagem que as pessoas têm de você passa a ser o “espírito” controlador, tomando o lugar do único Espírito que deveria ser nosso Controlador. Não queremos perder a imagem positiva que foi conquistada. Então aquilo que falamos, fazemos, postamos na internet ou vestimos não passa pelo filtro “estarei glorificando a Cristo se eu ______”, mas “o que as pessoas vão pensar se eu _______”.
A boa reputação pode ser um grande perigo espiritual. Com medo de perdê-la, seremos constantemente tentados à hipocrisia. Tentados a alimentar uma imagem sobre quem somos que muitas vezes não corresponde à verdade. Seja através de “pequenas” mentiras que ajudam a manter a reputação ou por meio de “pequenas” omissões para não manchá-la. Seremos tentados a agradar as pessoas para receber louvor em troca, e não para praticar um amor geuníno, sem hipocrisia (Rm 12.9). Haverá uma crescente dificuldade também em confessar nossos pecados. A preocupação de “o que ele(a) vai pensar de mim” lhe impedirá de abrir sua vida e mostrar como você também é um pecador desesperadamente necessitado de graça para ser fiel a Cristo. A boa reputação lhe roubará a naturalidade e a autenticidade. Ao invés de ser você mesmo, você tentará ser a sua reputação.
E uma coisa leva a outra. A inveja passará a andar ao derredor como leão que ruge procurando alguém para devorar. Isso porque outras pessoas que têm boa reputação passarão a ser potenciais competidores. E da inveja para a maledicência é um pulo. Assim como uma droga, com o tempo a boa reputação pode não ser mais suficiente. Você precisará de mais. Não apenas boa, mas uma reputação cada vez melhor. E isso funcionará como lenha para a fogueira da hipocrisia. E assim voltamos ao início do ciclo de pecado iniciado pelo controle que nossa imagem pode ter sobre nós.
Percebe como entramos em um labirinto? Veja a prisão que pode se tornar a boa reputação se ela tomar um espaço ilegítimo em nosso coração. Interessante (e triste) ver como algo bom, como a reputação, pode se transformar em um problema por causa do nosso velho ‘eu’ que insiste em nos dizer que precisamos da glória dos homens (manifestada na reputação) e não da glória de Deus. Claro, a lista de pecado aqui é apenas ilustrativa. Certamente há muitos outros perigos espirituais envolvidos.
O Resgate
“Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor” (Rm 7.25a). Não estamos jogados nessa prisão até a morte. Jesus morreu para resgatar também os pecadores prisioneiros da boa reputação. Jesus chama tanto aqueles de má quanto aqueles de boa reputação para acharem descanso nele. Abandonar o jugo duro e o fardo pesado de ser controlado pela reputação e encontrarem alívio naquele que é manso e humilde de coração.
Lembre-se que o único homem justo que pisou neste mundo conquistou uma péssima reputação ao longo de sua vida. Comilão, beberrão, blasfemo e pecador foram alguns dos títulos atribuídos a Ele (Mt 11.19, Mt 26.65). Nem todos o viam assim, é verdade, mas muitos. Número suficiente para levá-lo à morte. Mas Ele sabia que a opinião que realmente importa é aquela que vem dos céus: “Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo” (Lucas 3.22b). Por isso Ele viveu uma vida de submissão à vontade do Pai e não à imagem que as pessoas tinham dele.
E pensando no nosso caso, um autoexame nos levará a conclusão de que nossa reputação não é tão boa assim. Talvez seja boa aos olhos de alguns, mas diariamente as manifestações ainda presentes do pecado em nossa vida nos lembram que confiar em nossa reputação é construir uma casa na areia. Não é seguro. Mas a boa nova é que, pela fé, nossa reputação manchada pelo pecado é transferida para Jesus na cruz e destruída lá, e a reputação sem mancha dele é atribuída a nós. Deus não exige uma reputação perfeita de nós, mas que confiemos no Único limpo de coração. Unidos a Cristo pela fé, nossa reputação se torna perfeita aos olhos de Deus. Não precisamos da aprovação das pessoas. Já fomos aprovados por Deus. E através da declaração “perdoado” que Deus nos dá em Jesus podemos experimentar a liberdade de sermos controlado pela graça de Cristo e não por nossa própria imagem.
O plano de Deus para nossa vida não é construir uma boa reputação, mas nos transformar, de glória em glória, à imagem de Cristo (2 Co 3.18). Semelhança com Cristo, e não reputação, é a obra que Deus quer fazer em nós. E Ele está fazendo. E fará. O obstáculo da busca por aprovação dos outros é menor do que Aquele que venceu o mundo. Essa é nossa motivação para confiar no perdão e no poder para transformação.
Use sua boa reputação para honrar a Deus, aproveitando as oportunidades para testemunhar do amor de Cristo em sua vida. A boa reputação abre portas ao evangelho. Mas deixe também que as pessoas saibam que sua reputação não é tão boa assim. Eventualmente, por causa disso, sua reputação pode até melhorar.