“Tornaram os filhos de Israel a fazer o que era mau perante o SENHOR” (Juízes 10.6).
Essa é mais uma das vergonhosas marcas na história de Israel. Apenas durante o período em que a nação foi governada por juízes, essa é a sétima vez que a expressão “… fazer o que era mau perante do SENHOR” aparece (antes, em Jz 2.11, 3.7, 3.12, 4.1, 6.1, 8.33). Israel não apenas errou, mas vivia no erro. Não havia se sujado de lama uma vez, mas tomava banho nela todo dia.
Para piorar, o “mau” ao qual se refere o texto não era apenas um detalhe do culto que não era seguido ou uma festa judaica sendo comemorada no dia errado. Eles estavam adorando outros deuses! Eles estavam quebrando o primeiro dos 10 mandamentos: “Não terás outros deuses diante de mim” (Ex 20.3). Estavam deixando de servir ao único Deus verdadeiro para seguir falsos deuses de povos estrangeiros. Em uma das vezes que Israel se desvia do Senhor, o verbo usado pelo Espírito Santo para registrar a gravidade daquilo que estava acontecendo é o verbo “prostituir-se” (8.33). Alguns podem até achar a palavra forte, mas é provável que se existisse um verbo ainda mais pesado, ele seria usado. Prostituição espiritual era no que o povo hebreu estava envolvido. A esposa (Israel) estava trocando o marido fiel (Deus) por outros homens:
Então tornaram os filhos de Israel a fazer o que era mau aos olhos do SENHOR, e serviram aos baalins, e a Astarote, e aos deuses da Síria, e aos deuses de Sidom, e aos deuses de Moabe, e aos deuses dos filhos de Amom, e aos deuses dos filisteus; e deixaram ao SENHOR, e não o serviram. (Jz 10:6)
Por causa da constante infidelidade, Deus entregou o povo às nações vizinhas (vv. 7-9). O povo clamou a Deus, pediu que Ele os livrasse, mas a enorme paciência de Deus havia se esgotado. Acabou. Chega. Fim. O povo havia ultrapassado todos os limites:
O Senhor respondeu: “Quando os egípcios, os amorreus, os amonitas, os filisteus, os sidônios, os amalequitas e os maonitas os oprimiram, e vocês clamaram a mim, eu os libertei das mãos deles. Mas vocês me abandonaram e prestaram culto a outros deuses. Por isso não os livrarei mais. Clamem aos deuses que vocês escolheram. Que eles os livrem na hora do aperto!” (vv. 11-14)
Afinal de contas, quem não faria o mesmo no lugar de Deus? O marido dá inúmeras provas de seu amor pela esposa, protege-a, cuida, não deixa faltar nada e sempre que ela está em perigo vem salvá-la. Mas a esposa ignora tudo e o troca por outros homens várias vezes, dia após dia. Mas a história não termina aqui. O povo de Israel é persistente, tanto no pecado quanto no clamor. Percebem o terrível erro que cometeram (pela sétima vez!) e insistem: “Nós pecamos. Faze conosco o que achares melhor, mas te rogamos, livra-nos agora. Então eles se desfizeram dos deuses estrangeiros que havia entre eles e prestaram culto ao Senhor” (vv.15-16a).
Deus parecia estar irredutível. As chances de Israel haviam se esgotado. Nesse momento surge, então, uma força dentro do coração de Deus que Ele não consegue segurar, que Ele próprio não é capaz de conter. Essa força quebra as paredes da justiça e da ira de Deus e é derramada sobre o povo de Israel sob a forma de graça. Deus reage ao clamor do povo de uma forma sobre-humana: então, já não pôde ele reter a sua compaixão por causa da desgraça de Israel (vv.16b).
Deus vê a situação do povo de Israel. Vê as lágrimas e a dor. Vê o desespero humano e os sinais de arrependimento. E então o milagre da compaixão acontece. A bondade divina vence a maldade humana. “Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5.20). A misericórdia toma o lugar da ira. Não foi esse mesmo traço da personalidade de Deus que Jonas usou como desculpa para não pregar a mensagem de julgamento ao povo de Nínive?
Ele orou ao Senhor: Senhor, não foi isso que eu disse quando ainda estava em casa? Foi por isso que me apressei em fugir para Társis. Eu sabia que tu és Deus misericordioso e compassivo, muito paciente, cheio de amor e que prometes castigar mas depois te arrependes. (Jonas 4.2)
Quem estende braços compassivos a insistentes pecadores, como o Deus misericordioso? Quem aceita traidores em seu reino, como faz o Rei? Quem transforma inimigos em filhos, como o Pai tem prazer em fazer? Quem renova todo dia a aliança com a noiva-igreja, como o Noivo-Messias? Quem afasta de nós as nossas transgressões assim como o Oriente dista do Ocidente? (veja Sl 103.12). Quem é como o Senhor?
Stênio Marcius, na música “Fim de tarde”, poeticamente declama:
O Seu amor é tão forte, mais que o inferno e a morte
São torrentes que arrebentam o chão
Mais fácil secar os mares, apagar a estrela Antares
Que arrancar o amor do seu coração.
Não somos tão diferentes assim do povo de Israel. A história de cada um de nós está marcada por traições ao único Deus verdadeiro. Quantas vezes viramos as costas para o Senhor fiel e nos voltamos para falsos deuses, sejam eles fabricados com as mãos ou com o coração? Mas Deus ouve o clamor dos arrependidos. O Deus justo é também compassivo. E pecadores como você e eu precisam de compaixão. E essa compaixão foi manifestada, de forma definitiva e perpétua, quando o Pai enviou o Filho para sofrer a punição merecida por causa da nossa traição ao Deus fiel. Na cruz, a compaixão vence o pecado.
Se você está debaixo da disciplina de Deus, saiba que a disciplina em sua vida vem de um coração paterno compassivo – pois o Senhor corrige a quem ama (Hb 12.6). Se você tem enfrentado um período de intenso sofrimento, veja-o como a compaixão amorosa de Deus lhe purificando e fortalecendo – porque, quando sou fraco, então, é que sou forte (2Co 12.10). E se você anda longe dos braços do Senhor, pare de fugir. Não rejeite a oferta vinda do coração compassivo de Deus. Em Cristo, há perdão para você.
Pergunte a si mesmo: a compaixão é um traço da personalidade de Deus que vem a minha mente quando penso em quem Ele é? Experimente a compaixão de Deus em Jesus Cristo! Pois “as misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se a cada manhã. Grande é a tua fidelidade” (Lm 3.-22-23).