Enquanto me preparava para voltar às salas de aula nesta semana, relembrei minha primeira incursão como professor em tempo integral, uns vinte e três anos atrás. Eu tinha acabado de ser nomeado como docente na Universidade de Nottingham, e era necessário que eu participasse de um treinamento de três dias sobre como ensinar e, então, fazer um curso de reciclagem com a mesma duração dois anos depois. Nas duas ocasiões, minha esposa entrou em trabalho de parto no segundo dia. Felix culpa de fato, pois pude deixar prematuramente esse curso sem sentido e voltar para o mundo real. Nós não tínhamos programado as gravidezes desta forma, mas o que posso dizer? Deus é bom. Deus é muito bom.
Eu me lembro das sessões de que participei por causa da desolada e desconexa natureza de seu conteúdo. Nada do que ouvi foi relevante para qualquer coisa que ulteriormente eu fiz em uma sala de aula. Havia um monte de jargões da moda: “aquário de peixes”, “jornadas educacionais compartilhadas”, “transferir habilidades”, etc. E havia a costumeira verborreia: “Não existem professores, apenas aprendizes. Palestrantes e estudantes aprendem juntos em sua jornada mútua”. Na época, lembro-me de pensar que isso era auto-evidentemente falso. Eu estava sendo pago para ensinar. Meus alunos estavam pagando (embora indiretamente, naqueles dias) para serem ensinados. Siga o dinheiro, como eles dizem.
O que era mais surpreendente, contudo, era a redução do ensino a algo meramente técnico. A disciplina que ensinávamos era aparentemente irrelevante. A sala estava cheia de historiadores, teólogos, filósofos, médicos, enfermeiras, engenheiros. Mas isso não importava porque, em última análise, a educação não se tratava de conteúdo disciplinar. Pelo contrário, deveríamos usar nossas disciplinas para ensinar “competências para a vida”. Considerando que muitos de nós naquela sala tínhamos tomado a desastrosa decisão de fazer um PhD e, assim, dramaticamente reduzido nossa utilidade à sociedade assim como nosso potencial aquisitivo, a possibilidade de ajudar outros com suas “competências para a vida” parecia bastante remota.
Obviamente, essa banalidade não foi porque eu escolhi tornar-me professor, e duvido que já tenha motivado alguém que realmente tornou-se um dos bons. Na verdade, não foi nem porque eu tinha escolhido ser ensinado. Eu não fui motivado a estudar a cultura clássica na universidade por um desejo de aprender “competências para a vida”. Eu fui motivo por um desejo de aprender sobre o mundo, desvendar alguns de seus mistérios, aprender naquele próprio ato de aprender o quanto mais eu não sabia e nunca poderia saber e, assim, contemplar com admiração cada vez maior a incomensurável vastidão do universo, ainda que aquele pequeno pedaço dele cultivado pelos seres humanos ao longo dos milênios. E eu não queria estar em sala de aula para estar em um “aquário” ou numa “jornada de mútua descoberta professor-aluno”. Não. Eu queria testemunhar uma formidável mente humana lutando com os mistérios da condição humana e se ocupando com grandes verdades.
Na semana passada, eu percebi na Public Discourse como a perda de uma metafísica da personalidade subjaz o problema atual da liberdade de expressão nos campi. Este é o lugar mais óbvio onde vemos essa perda, mas também há uma conexão com o problema da educação como um tudo. Cursos como o que assisti não têm uma metafísica ou, talvez melhor, eles têm uma anti-metafísica implícita, talvez até inconsciente e involuntária. Eles priorizam a razão instrumental, implicitamente negam a transcendência e, em última análise, transformam o mundo em um lugar cinza, prosaico e sem alma.
Onde a verdade é um construto pessoal, onde não há transcendência, onde o indivíduo deve criar o mundo, e não descobri-lo, o relativismo reina supremo. E onde o relativismo reina supremo, o conhecimento se torna uma questão de crítica constante tendendo a niilismo cínico ou meramente um instrumento para obter-se aquilo que escolhemos desejar – dinheiro, sexo e poder sendo as três categorias básicas. E o ensino é inevitavelmente prostituído para esses fins.
E é por isso que eu amo ensinar à maneira antiga, à maneira que é motivada por uma convicção metafísica sobre o mundo e sobre a verdade. Para mim, esse tipo de pedagogia é um ato de rebelião nesta presente era – uma pequena tentativa de transmitir a ideia de que o mundo é dado, não construído, e que o sentido deve ser achado, não criado. Um bom professor sempre deve ser motivado por convicção – de que o mundo existe e tem sentido, e que é muito maior do que qualquer pessoa pode jamais assimilar.
Ensinar – ensinar de verdade, não apenas transmitir técnicas ou potencial aquisitivo – é talvez o chamado e privilégio mais prazeroso do mundo. Tem seus desafios, mas traz alegrias incomparáveis. A segunda maior alegria que tenho como professor é ver aquele lampejo nos olhos de um aluno quando um conceito anteriormente desconhecido ou mal compreendido subitamente se torna claro por causa de algo que eu disse. E a maior alegria (embora mais rara) é a que experimento quando um aluno escreve ou diz algo que indica que eles foram além do que eu, como professor, poderia ter lhes ensinado. Quando eles se tornam maiores, eu deleito em tornar-me menor. Pois esta é a ordem correta das coisas se ensinar é realmente uma questão de verdade, e não de poder ou fazer discípulos. Ainda assim, nenhuma alegria é possível onde não há verdade para descobrir e onde o mundo é simplesmente o que o mais agressivo e barulhento entre nós se importa em dizer que é. Ensinar bem é um questão de metafísica.
Parar preparar-me para o novo ano letivo, eu tenho lido o belíssimo livreto sobre ensino de James Schall, Docilitas. Esse fino volume tem mais sabedoria e inspiração para os professores em uma única página que uma miríade de “jornadas mútuas” e toda a pretensiosa bobagem anexa. Como Schall expressa, “a consolação do professor, em seu ápice, é quando ele percebe que seus alunos, embora gratos, buscam além dele o que há e ao mistério de por que uma coisa é, em vez de não ser”.