Na última Sexta-Feira cumpri minha promessa de levar meu pequeno rebanho de filhos para assistir o filme que eles vinham aguardando o ano inteiro: ‘Vingadores: Era de Ultron’. Eu esperava ter que explicar algumas coisas, como eu faço em qualquer filme, e o fiz. Houve uma ou outra profanidade. O vilão tinha um certo ‘complexo de messias’, inclusive com algumas citações do Próprio Messias. Mas o que mais me surpreendeu foi a centralidade da família nesse filme. E, por família, eu não estou falando do conceito elástico e redefinido de “famílias”, mas uma afirmação contracultural da estabilidade da família natural e nuclear.
Deixe-me avisar logo que vou dar alguns spoilers para quem ainda não viu o filme, mas deixe-me dizer também que não há nada aqui que vai estragar o filme para você. Na verdade, o fato de que o que eu vou falar inclui uma “surpresa” da trama é exatamente parte do meu argumento.
Em certo ponto do filme, o grupo de super-heróis se encontra fugindo em frangalhos, sem ter onde se refugia de um Ultron virtualmente onisciente (olha o complexo de Messias novamente). Até que eles encontram um ponto no mapa onde não poderão ser achados. É a casa do Gavião Arqueiro, isolada em uma área rural. A grande surpresa é que, esperando por ele, estão sua mulher e seus filhos. O arqueiro nunca contou a seus colegas, ou seus superiores, sobre sua família para mantê-los protegidos de sua vida de perigos.
A ideia de ter uma família parece chocar a todos. Ninguém sequer havia pensado na possibilidade. Mais cedo, no filme, quando o Gavião Arqueiro tem uma ferida restaurada por meio de pele regenerada (alerta de spoilers novamente, me perdoe), a doutora fala “Nem a sua namorada vai perceber a diferença”. Em uma das cenas mais comoventes do filme, a esposa do arqueiro passa a mão em seu abdômen e diz “eu consigo perceber a diferença”. Essa não é uma namorada. Isso é uma só carne, mente e corpo, uma esposa e seu marido.
Além disso, a casa é um refúgio. Com todo o caos acontecendo no mundo ao redor, essa casa, cheia de crianças correndo e peças de Lego espalhadas pelo chão, é um lugar de paz. É, como Cristopher Lasch costuma dizer, “um porto seguro em um mundo sem alma”. Até mesmo Bruce Banner parece tranquilo nesse lugar (e nós saberíamos imediatamente se ele estivesse nervoso). Ao contrário do Super-Homem, a fortaleza desses heróis não é de solidão.
A vida de marido e pai do Gavião Arqueiro não é vista como algo que diminua seu heroísmo. É algo apresentado quase que como um luxo, algo a ser invejado, aspirado. Mais tarde, no filme, a Viúva Negra revela que parte de seu treinamento envolveu sua esterilização. Isso é visto como uma profunda perda. O Capitão América olha para a vida do Arqueiro e se pergunta se a possibilidade de ter algo parecido morreu quando ele foi enterrado no gelo durante a Segunda Guerra.
É interessante que a vida familiar “tradicional” do Arqueiro é vista como contracultural, no melhor sentido do termo. Pelas últimas duas ou três gerações, os heróis da cultura popular estiveram tentando escapar da “conformidade” engessada da família nuclear. Nesse filme, entretanto, a conformidade parece ser namorados, encontros e, implicitamente, sexo e romance, mas não casamento e família. Uma família de marido, mulher e filhos é mais surpreendente que robôs com inteligência artificial, animação suspensa e monstros de radiação Gama.
Talvez isso seja um sinal de um desejo por algo diferente. Como já disse muitas vezes antes, a Revolução Sexual não consegue cumprir suas promessas. O colapso das famílias não traz a liberação que alguns esperavam. Aqueles de nós que acreditam nos antigos caminhos precisam nutrir esses hábitos e práticas, não apenas em obediência a Deus e não apenas para o nosso próprio florescimento, mas pelo bem das próximas gerações. Famílias projetadas de acordo com o padrão de Cristo serão algo estranho e até absurdo, mas, às vezes, o estranho e absurdo é exatamente o que as pessoas estão buscando. De fato, amor, casamento e família: às vezes até os super-heróis precisam do que eles nem imaginavam que queriam.