“A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós” – 2 Coríntios 13.13
B. B. Warfield, há muito, observou que os escritos apostólicos não desenvolvem a doutrina da Trindade, mas a pressupõe. O Novo Testamento não é a evidência de um estágio de transição da evolução da fé trinitária, a qual teria sido conceituada e codificada nos séculos seguintes. O Novo Testamento demonstra a presença, na igreja apostólica, de uma fé trinitária profundamente enraizada, a qual, quase sem esforço, articula a si mesma em resumos trinitários dos eventos ocorridos nos evangelhos (Gálatas 4.4-7), formulações trinitárias da prática sacramental (Mateus 28.19), explosões trinitárias de louvor (Efésios 1.3-14) e bênçãos trinitárias, como a que temos em 2 Coríntios 13.13.
Esse pequeno versículo é uma teologia trinitária da salvação em miniatura. Tal qual o Deus por meio de quem Paulo abençoa é uno e trino, assim também a salvação que o texto exalta é una e trina.
2 Coríntios 13.13 coordena cada fase do trabalho salvífico de Deus – desde sua concepção, passando por sua realização até os seus efeitos – para cada pessoa distinta da Trindade. Assim, a “graça do nosso Senhor Jesus Cristo” coordena a realização da obra salvífica de Deus pelo Filho: nosso Senhor e irmão mais velho que, graciosamente, se humilhou para carregar nossa maldição e o qual foi gloriosamente exaltado para conceder a benção de seu pai (2 Coríntios 8.9). “O amor de Deus” faz referência ao conceito do trabalho salvífico feito pelo Pai, cujo amor iniciou o sacrifício do seu Filho amado (João 3.16) e cujo amor pretendia nos adotar como consequência graciosa desse sacrifício (Efésios 1.4-5). “A comunhão do Espírito Santo” coordena o efeito da obra salvífica de Deus por meio do Espírito, o qual leva-nos à adoção pelo Pai (Gálatas 4.5-6), por meio da comunhão mística com o Filho (Efésios 1.3) e da comunhão corporativa da igreja local (1 Coríntios 12).
O texto não coordena as três pessoas da Trindade com as três fases de salvação porque as três pessoas não são unidas nas três fases do trabalho salvífico de Deus (as obras externas de Deus, afinal, são indivisíveis), mas para sublinhar a distinta glória de cada pessoa em particular em cada fase específica da salvação. Consequentemente, assim como o caráter pessoal distintivo do Pai repousa em gerar o Filho e em soprar o Espírito, também é seu caráter pessoal distintivo conceber, cintilando com um brilho particular, o plano da salvação em amor. Assim como o caráter pessoal distintivo do Filho é ser gerado pelo Pai e soprar o Espírito, também é seu caráter pessoal distintivo cumprir, cintilando com um brilho particular, o plano gracioso que traz muitos filhos para a glória. Assim como o caráter pessoal distintivo do Espírito é ser soprado tanto pelo Pai como pelo Filho em sua mútua comunhão e amor, também é seu caráter pessoal distintivo nos receber, cintilando um brilho particular, no fruto ou efeito do gracioso plano de salvação de Deus: a comunhão do Espírito.
Duas breves observações à discussão acima.
Primeiro, diferentemente da leitura feita por Warfield, esse verso não contradiz o princípio de que existe uma procissão ordenada dentro da Trindade, mas confirma. Embora, sintaticamente, o Filho preceda o Pai e o Espírito nesse verso, sua posição no trabalho da salvação corresponde à sua ordem dentro da Trindade, como visto anteriormente. O significado de 2 Coríntios 13.13 para a teologia trinitária, podemos dizer, repousa não na sintaxe, mas na semântica. 2 Coríntios 13.13 nos apresenta à salvação iniciada pela primeira pessoa, cumprida pela segunda pessoa e aperfeiçoada pela terceira pessoa, correspondendo à eterna relação delas três.
Segundo, assim como as próprias pessoas, as fases do trabalho salvífico de Deus também podem ser distinguidas. Entretanto, assim como as pessoas, esse trabalho não pode ser dividido. A salvação, assim como o próprio Deus, é uma. Não há a concepção da salvação sem seu cumprimento. Nem há salvação sem seu efeito.
Essa observação, para mim, possui poderosas implicações em como pensamos o papel da igreja local nos propósitos salvíficos de Deus. Se é realmente verdade que a comunhão do Espírito (com o Pai, por meio do Filho, na igreja local) é inseparável da graça do Senhor Jesus Cristo e do amor de Deus Pai, então não devemos criar expectativa de desfrutarmos da graça de Jesus Cristo ou do amor do Pai fora da igreja, a comunidade na qual a comunhão do Espírito floresce. Assim, na medida em que nós nos inclinamos para o amor do Pai e para a graça do Senhor Jesus, nós devemos nos inclinar para a comunhão do Espírito, no local onde ele derrama as realidades da comunhão: na igreja local.
E esse parece ser o motivo pelo qual Paulo conclui a série de exortações para a restauração, conforto mútuo, concordância e paz – veja 2 Coríntios 13.11 – com uma benção trinitária. O Deus triúno de amor, graça e comunhão é o mesmo cuja benção e presença é absolutamente essencial em formar uma comunidade caracterizada pela restauração, conforto mútuo, concordância e paz.