“Deus é amor” e a Eleição

Adam Parker

Há uma questão que ouço bastante. Ouço tão frequentemente que ela merece alguma atenção. A pergunta é, falando de maneira clara, sobre a doutrina da eleição e a doutrina do amor de Deus. Se a eleição é verdade, então como Deus pode chamar a Si mesmo de amor quando a maioria de Sua criação será separada dEle por toda eternidade?

A primeira coisa a se fazer quando lidar com essa pergunta é entender os conceitos de maneira correta desde o começo; Quando a maioria das pessoas ouve a frase “Deus é amor”, elas pensam que significa “Deus me ama”. Na realidade, esta é uma declaração que está fundamentada na ontologia (a natureza) do próprio caráter de Deus. Se Deus é amor, então Ele sempre tem sido eternamente amor; e esse amor não pode ser meramente atribuído à existência de seres humanos. De outra forma, João teria baseado na humanidade o conceito do amor de Deus. Pelo contrário, o Apóstolo João diz: “Deus é amor”. Deus ama a Si mesmo, e ele sempre amou a Si mesmo. Todas as suas ações refletem um amor e um compromisso com Seu próprio nome, sua própria glória, sua própria fama, etc. Isso se relaciona à doutrina da divina simplicidade, em que mesmo a ira de Deus é amor, porque ela não inclui concessões quanto a Ele. Quando Deus está irado, ele está preservando e amando Seu próprio nome, Sua própria glória, ao punir aqueles que a desrespeitam.

Assim, a ideia de que Deus ama a Si mesmo não exclui Sua manifestação do amor que Ele já tem pela humanidade. Mas todos os atos e expressões que Deus demonstra serve a seu propósito principal: expressar o amor de Deus por si mesmo. Se isso não acontece, o amor de Deus é comprometido. Torna-se um tipo de amor idólatra e infiel. Cada e toda coisa que Deus faz está fundamentada no amor… a Si mesmo, primeiramente.

Portanto, quando vemos a ira de Deus, estamos vendo amor. Embora seja um tipo de amor teocêntrico que a maioria dos evangélicos dificilmente tenha sequer considerado. Da mesma forma, quando ouvimos e recebemos a oferta de salvação encontrada em Jesus, também estamos vendo o amor de Deus por Si mesmo. Essa salvação serve para enfatizar e demonstrar a graça de Deus a seus inimigos. Os evangélicos, em sua maioria, têm confinado o amor de Deus a essa segunda manifestação. Eles dificilmente podem ver quão amável é a ira de Deus, mas eles pensam que veem muitas coisas amorosas em Sua misericórdia.

Se realmente estivermos pensando dessa forma, então seremos mais perturbados pela salvação que pela condenação. A salvação apresenta problemas enormes para o amor de Deus. Isso se dá porque na salvação, nós temos Deus, um bom juiz, atuando como um mau juiz e inocentando o culpado. Ele parece tratar Seu nome levianamente. Ao salvar pecadores, Ele não parece amar e defender Seu próprio nome. Existe muito mais problema em Deus perdoando o ímpio que há na execução de sua justiça sobre pecadores que a merecem.

Então, olhe novamente para a reclamação diante de nós. “Como Deus pode chamar a Si mesmo de amor quando a maioria de Sua criação será separada dEle por toda eternidade?”. A pergunta assume que a medida do amor é a criatura encontrar união com Deus na eternidade. E, sem dúvida, há muita verdade nisso – especialmente da perspectiva humana. Porém, se vista sob a perspectiva divina, a reclamação mostra-se falha. “Deus é amor” é compatível com qualquer e toda ação de Deus, porquanto Ele está sempre agindo de uma forma que primariamente promova Seu próprio nome.

Esse entendimento da essência de Deus como “amor” nos dá uma base fundamental para um entendimento verdadeiro, robusto, biblicamente fiel da eleição. Se não tivermos essa base, então estaremos constantemente dizendo: “mas Ele poderia ter feito mais! Ele poderia ter sido mais amoroso!”. Essas reclamações perdem a força quando podemos ver o amor de Deus em sua ira e em sua justiça. A mentalidade bíblica, então, não protesta, mas clama: “Mostre-nos sua glória! Mostre-nos sua justiça! Mostre-nos sua graça! Mostre-nos o Senhor!”. Ela não pode – é incapaz – reclamar que Deus não tem feito o bastante disso ou daquilo.

Devemos levar em conta, também, que o número de eleitos que habitarão os céus e adorarão ao Senhor da Glória será mais numeroso que as areias do mar (Jr 33.22). Esse não é um número pequeno. Eu disse em outro texto que é estimado que existiram aproximadamente 635 bilhões de pessoas no decorrer da história. Se mesmo uma pequena fração desse número recebeu o dom da salvação, então podemos considerar a população do céu como numerosa. Leve em conta que a população de Phoenix, Arizona, onde eu viva, é de aproximadamente 4,3 milhões. Ouso dizer que se Deus salvasse somente 4 milhões de pessoas em toda história da humanidade, teríamos de considerar um número tremendo. Ainda assim, o número certamente é maior ainda que esse. Os exércitos do céu serão tantos que ficaremos maravilhados pelos homens e mulheres comprados por nosso Senhor.

Dito isso, não há lugar para reclamação. Não há espaço para conflito contra a doutrina da eleição ou o número de salvos. Qualquer reclamação ou acusação de injustiça ou crueldade da parte de Deus é minimizada pelo amor de Deus por Si mesmo e por Seu próprio nome.

Traduzido por Josaías Jr. | iprodigo.com |