Nota do tradutor: esse texto tem spoilers da sexta temporada de Lost, até o episódio sete. Se não quiser estragar a surpresa, não siga adiante!
Embora ainda não esteja claro como LOST irá terminar, alguns desenvolvimentos recentes parecem dar uma boa ilustração de um jeito que as pessoas escolhem para resolver o problema que aflige a humanidade por toda a história: lá no fundo, sabemos que merecemos a justiça de Deus, mas queremos a graça. Como podemos, sabendo que somos culpados, alcançar misericórdia de um Deus perfeitamente bom e justo?
Justiça e graça parecem irreconciliáveis. Queremos que Deus seja bom. Mas, se merecemos punição, então, para que Deus seja verdadeiramente bom e justo, Ele deve punir. Nós esperamos pela graça. Mas, para Deus mostrar-nos graça, parece que Ele deveria violar a perfeita justiça, e, portanto, Ele não seria verdadeiramente bom.
Uma maneira de resolver isso é separar Deus em dois e rejeitar uma metade.
Nós amamos um deus de misericórdia, mas tememos um deus de justiça. Portanto, negamos Sua justiça e, de repente, Deus nos ama, não importa o quê, e não importa o que fizemos. Não há justiça para enfrentar. Mas, esse é um deus bom? Um deus que não conserta o errado, que ignora o mal e o varre para baixo do tapete, que te diz: “ei, simplesmente aprenda a fazer seu próprio tipo de música¹ – é tudo bom”, é um deus digno do seu respeito? Justiça é real e boa, portanto, um deus que permite que o mal e a injustiça persistam é menos que bom.
Também existem aqueles que sustentam firmemente a ideia da perfeita santidade de Deus e de sua bondade em destruir o mal, e então se desesperam quanto à misericórdia, e vivem com medo. Essas pessoas se agarram à justiça de Deus e rejeitam a possibilidade da graça.
A resposta de Deus a esse problema é mais que brilhante:
Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus, tendo o testemunho da lei e dos profetas; isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que creem; porque não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus; sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus. Ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus; para demonstração da sua justiça neste tempo presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus. (Romanos 3.21-26).
Deus não deixou de lado Seu desejo bom e perfeito de eliminar todo o mal, e mesmo assim, Ele não deixou de lado Sua graça – Ele tornou-se justo e justificador, justo juiz e gracioso redentor. Ele satisfez Sua perfeita justiça e preservou Sua retidão ao manifestar Sua ira contra o mal na cruz. Agora, a graça é concedida livremente porque não está mais conflito com a justiça. Pelo contrário, é devido à justiça, consumada por meio do sacrifício espontâneo de Jesus, que toda beleza e poder da graça são revelados, pois vemos o verdadeiro custo disso.
Esse é o verdadeiro e completo Deus. A verdadeira história não é aquela em que justiça e graça estão eternamente em guerra contra a outra, mas aquela com um custoso sacrifício, que satisfaz à justiça e permite a graça, realizado por um bom juiz, que tem o direito e a autoridade para julgar.
Esse é o Evangelho, ainda que eu tenha conhecido muitas pessoas que ouvem a história cristã, mas são capazes de ouvir somente o trecho sobre o juiz perfeito, que elas sabem que as destruirá, quando todos os erros forem punidos no fim. Eles não podem ver além da justa ira de Deus na cruz. E pessoas que reconhecem sua própria culpa, mas não sabem nada sobre a cruz, irão ou reconhecer a justiça inflexível de Deus e odiá-lO, ou negar Sua justiça e viver com um deus moralmente fraco. Isso se parece com o que está acontecendo em LOST (spoilers a seguir). Os escritores gostariam de aceitar a graça, como fizeram poderosamente no episódio “Dr.Linus”, mas, ao mesmo tempo, negam a bondade da justiça, ao associar o julgamento ao aparentemente demoníaco Man in Black². Eles não conseguem ver que, ao negar o valor do julgamento, eles removem todo o poder da graça, tornando-a fraca e vazia. Pois, se “Deus” quer que façamos nossa própria moralidade, e não julga o mal, então não há culpa para sermos libertos, nem necessidade de graça. Apenas espera-se que alguém diga: “ah, suas mentiras, sua manipulação e seu crime de assassinato não são grande coisa. Vamos seguir adiante”. Isso não é bom, nem poderoso.
Os criadores de LOST não conseguem encontrar um caminho para que justiça e retidão sejam verdadeiramente boas e desejáveis, ao mesmo tempo em que a graça é possível. Então, eles abandonam o julgamento em favor da graça (ou assim parece, até agora). Sem uma cruz, pela qual a justiça pode ser feita e a graça concedida, eles devem dividir Deus em dois, atribuindo sua graça à Jacob e Sua condenação do mal ao manipulador Man in Black. E assim, vira Jacob contra Man in Black, graça contra julgamento, “Jesus” contra o assustador “Deus do Velho Testamento”. E, dessa forma, perdemos tanto a justiça quanto a graça.
¹ Referência a Make Your Own Kind Of Music, de Mama Cass Elliot, música que abre a 2ª temporada da série. (N.T.)
² Preferi manter o termo original (N.T.)
Traduzido por Josaías Jr | iPródigo | Original aqui