Alma de BBB

Josaías Jr.

Antes de mais nada, sim, assisti a algumas edições do Big Brother Brasil, embora não seja algo que goste de falar por aí (mas, veja só: estou publicando aqui), nem recomende. Assisti às primeiras edições por curiosidade – afinal, antes de tornar-se repetitivo e não uniformizarem todos os personagens, o BBB realmente era algo inédito: alguns estranhos confinados em uma casa? O que aconteceria? Nessa época, tudo era novidade: as situações variavam, os chavões não eram chavões (alguém teve de criar o clássico “O Brasil está vendo”) e o apresentador Pedro Bial não era ainda um filósofo tão ruim.

Depois de algumas edições perdidas, fui movido a assistir novamente pela profissão. Dizem que o publicitário deve estar atento à maneira como a sociedade e os anunciantes reagem e usam o BBB. Se uma coisa move a população, você, publicitário, deve entender. Meu interesse era sinceramente mercadológico, mas isso não me impedia de ter meus participantes favoritos ao prêmio. Ou, pelo menos, aqueles que eu considerava menos insuportáveis. Hoje não vejo mais, embora o Globo.com e os usuários do Twitter insistam em me informar sobre o assunto…

Dito isso, há alguns anos notei um padrão de comportamento entre os participantes do BBB que coincide com o padrão tanto de amigos e conhecidos incrédulos, quanto de irmãos em Cristo. E pior: coincide com certos padrões em minha vida! Aquelas pessoas não são meros baladeiros em busca da fama, elas têm desejos, vontades, um coração e uma cosmovisão. Como qualquer pessoa, elas têm pressuposições aprendidas – seja com pais, amigos, na televisão, na cultura, ou mesmo por dedução e indução lógica (tá, talvez eu tenha exagerado). E, por meio de seus atos, discursos e aparência, ela não apenas manifestam, mas propagam suas ideias e atitudes.

E, acredite se quiser, nossos queridos “guerreiros” (como diz Bial) podem nos ensinar um pouco sobre os vícios e as esquisitices de nossa cultura. E revelam pecados que eu também cometo.

O que caracteriza nossa “alma de BBB”?

Exibicionismo, ou biblicamente falando, falta de modéstia. Não é preciso ligar a televisão para saber que a maioria dos participantes do programa é escolhido não por ter um belo físico, mas por querer muito mostrar esse físico. Assim, a modéstia, característica das cristãs piedosas (1 Tm 2.9) não tem espaço ali. E embora o verso de Paulo trate especificamente de mulheres, os homens também caem no erro da autoexibição. Deus criou o corpo e ele certamente é bom e belo, porém, após a queda ele deve ser exibido a apenas uma pessoa – o cônjuge em um casamento bíblico. Isso não é mero moralismo, mas amor a si e ao próximo.

Um dos vencedores do BBB

Esse erro se repete, por exemplo, em nossas versões particulares de reality show – as redes sociais. Certa vez, falei algumas coisas impopulares no púlpito: questionei a necessidade que jovens cristãos e cristãs têm de publicar em seus álbuns virtuais fotos em poses sensuais ou mesmo trajando apenas biquíni, sunga, etc. Novamente, a base para isso não era moralismo, não eram os trajes em si ou meus costumes retrógrados, mas o que Paulo diz em 1 Coríntios 13: o amor não se porta de maneira inconveniente. Comentaristas afirmam que essa inconveniência tem a ver com a imoralidade e a falta de decoro característica de membros da igreja de Corinto. Se portar indecorosamente não é amar.

Nada mais inconveniente para pessoas que procuram uma vida santa (e muitas vezes batalham por uma mente limpa de fantasias e desejos) que ver irmãos ou irmãs em Cristo, com quem convivem semanalmente, colaborando para mais uma queda¹.

Desejo pela celebridade. Embora logo associemos a falta de modéstia à nudez ou trajes mínimos, esse não é apenas um problema de corpos, roupas e joias, mas do desejo humano de gloriar-se em si mesmo, de chamar atenção para si, e saber que os outros também estão olhando e admirando². Não foi esse o pecado dos construtores da Torre de Babel? Eles não queriam construir um prédio, queriam construir um nome: “Vinde, tornemos célebre o nosso nome” (Gn 11.4). Sim, eles queriam ser celebridades.

Enquanto criticamos aquelas mulheres e homens, podemos viver na mesma busca que eles. Eu gostaria que esse texto tivesse muitas visitas. Por quê? Para abençoar, para glorificar a Deus, para criar uma publicidade para meu site ou para ser conhecido? Se as pessoas são meu foco, descubro em mim um terrível pecado: o temor ao homem.

Novamente, volto-me às redes sociais: quanto tempo gastamos mostrando para as pessoas quão legais, inteligentes, simpáticos, divertidos e interessantes somos? Não queremos ser celebridades igual os BBBs… nosso círculo social já basta. Eu sou fã de redes sociais, sei que existem bons motivos para falarmos sobre nossa vida (quem não gosta de compartilhar bons momentos?), mas posso também ser motivado por uma necessidade de autoexaltação às vezes.

Falta de masculinidade e feminilidade. Ao ler isso, alguns associarão esse item às recentes inovações da Globo em convidar homossexuais, transexuais e travestis para o programa. Embora essa seja uma preocupação, ela é apenas um lado de um problema generalizado: homens que deixaram de ser homens. E isso inclui homens heterossexuais.

Masculinidade e feminilidade

No BBB (no mundo e também na igreja), há muito tempo nós, homens, abandonamos o posto de líderes, cabeças e pastores. Seja por covardia, por preguiça ou imaturidade, o que vemos hoje são garotos (de todas as idades) deixando o chamado divino para sermos Vice-gerentes da Criação a fim nos dedicarmos a nossos brinquedos. E, infelizmente, um dos brinquedos favoritos de alguns de nós são as garotas.

Em seu livro Qual a diferença?, John Piper nos lembra que a masculinidade madura manifesta-se na proteção e sustento das mulheres ao nosso redor. Assim, aquele que vê a mulher como apenas uma presa, como mais uma para pegar na balada, uma parceira de uma noite, um brinquedo para divertir-se, pode ser considerado pelos amigos o maior de todos os homens, o herói dos heróis e um exemplo para ser seguido. Mas, aos olhos de Deus, ele deixou de ser macho há muito tempo.

“Eu não sou piranha, mas não sou santa. Eu sou mulher”, já disse uma participante. Como consequência do nosso fracasso masculino (e colaborando com ele), as mulheres tendem a abandonar seu chamado de se tornarem cooperadoras e auxiliadoras de Adão. A imodéstia não é apenas um desejo de exibição, mas uma tentativa de controlar o outro. Ao mesmo tempo, porém, aceitar uma “ficada”, uma relação fast-food, os braços de um “pegador” é concordar em participar do jogo que os homens propõem – é deixar de ser uma cooperadora idônea, uma parceira (o chamado de Gênesis 1 vem para mulher e homem), para se tornar controladora ou controlada.

Amor ao dinheiro, ou o culto a Mamon. Pelo prêmio do BBB, vale mentir, se exibir, ofender, trapacear e manipular – mas “isso é um jogo”, dizem os participantes. Lembro-me daquela história sobre a proposta que um senhor faz a uma garota: “você dormiria comigo por 1 milhão?”. Ela prontamente responde que sim. Em seguida, o homem apresenta outra proposta: “e por 5 reais?”. Indignada, a moça responde: “Nunca! Quem você pensa que eu sou?”. O senhor prontamente responde: “Isso nós já sabemos. Agora estamos apenas discutindo o preço”.

A verdade, porém, é que criticamos os BBBs, mas já nos vendemos por menos que 1 milhão e meio de reais. Alguns de nós já tiraram o dinheiro da carteira dos pais (fiz isso quandro criança), enquanto outros sonegam impostos. Também podemos ser funcionários picaretas (somos pagos pra trabalhar, lembra?). Carregamos carteirinhas falsas para o cinema e amamos jogar na loteria. Por trás disso, encontra-se o amor ao dinheiro, a adoração a Mamon, a origem de todos os males. Quando pensamos que o dinheiro nos trará conforto, alegria, sustento, ele passa a ditar as regras, não o Senhor. E assim surge mais um ídolo.

Autonomia moral. A frase de um participante do programa resume bem esse tópico: “O importante é o que eu tô pensando. Se eu me aceito, acho que isso é o que importa”. Para homens e mulheres da nossa sociedade não existem mais absolutos morais ou mesmo a noção de certo ou errado, o que importa é o que sinto em relação à minha decisão. Se desejo isso e meu coração não me reprova, é certo fazer. Se me sinto mal, não é minha consciência ou a lei natural que Deus nos deu, mas a pressão de uma sociedade conservadora.

Mesmo cristãos professos abraçam tal ideia, quando afirmamos, por exemplo, que não sentimos algum tipo de “toque do Espírito Santo” que nos impeça de abandonar uma prática errada ou tomar uma decisão certa. Entendemos que se apenas estivermos nos “sentindo-se bem” em relação a Deus, não há problema no que fazemos. O que esquecemos é que a Lei revela a vontade de Deus e que precisamos ser sondados sempre (Salmo 119.4; 139.23,24), pois nosso coração é enganoso (Jr 17.9).

Buscar o certo e o errado em nosso interior nos conduzirá ao erro. Precisamos pedir iluminação ao Espírito para que compreendamos a Lei e suplicar que Ele nos guie e nos transforme. Caso contrário, estaremos caindo no erro de nos fazermos senhores de nossa própria história. E nada pior que substituir um Grande autor por um pequeno e incompetente imitador.

Pequeno e incompetente

Se agimos e pensamos dessa forma, isso se deve a uma falha básica em uma importante pressuposição: nossa visão de Deus é limitada demais. O glorioso Deus da Bíblia, o grande Criador e Redentor, foi substituído por algo mais parecido com nós mesmos – um deus ausente, indulgente, distante e que nos adora. Errando no primeiro ponto, todos os outros se corrompem.

Quando não procuramos entender e conhecer quem é o Deus Triuno, acabamos sem entender quem somos, o que é certo ou errado, para que fomos criados e quem é realmente o Senhor da História. Não fomos feitos para sermos vistos e glorificados, fomos feitos para contemplar e celebrar o Soberano Rei.

Em Cristo,

Josa (tentando sair do centro de sua própria vida e pedindo perdão pelo post longo)

P.S.: Em um próximo post, tentarei comparar a divindade que talvez estejamos seguindo e a versão menor que provoca essa síndrome de BBB que vivemos. O que seria uma espiritualidade de BBB?


1 (Para saber mais sobre modéstia, leia o excelente capítulo Deus, Meu Coração e As Roupas de CJ Mahaney aqui. Recomendo especialmente a parte 4: a carta de um estudante lutando por pureza)

2 Veja: talvez nem todos os BBBs estejam ali por isso (é possível que alguns queiram realmente chamar atenção para alguma causa, por exemplo), mas certamente é algo que ocorre naquela casa.