Ouvir os parentes daqueles que foram impiedosamente mortos na igreja de Charleston foi uma oportunidade de testemunhar uma das melhores teologias que você verá em sua vida. Eu somente espero que, se algum dia enfrentar uma situação semelhante, possa reagir pelo menos a metade de quão bem aquelas pessoas reagiram ao falar com Dylan Roof.
Bastante surpreendentemente, contudo, alguns aproveitaram para achar falhas na forma como os parentes ofereceram perdão ao assassino porque eles disserem as palavras “eu perdoo você” sem qualificar suas palavras.
Baseado em Lucas 17.3-5, o argumento diz que eles não podem dizer “Eu te perdoo”. Por quê? Porque não há arrependimento. Para o perdão acontecer, deve haver arrependimento. Incidentalmente, eu realmente ouvi um dos parentes instando para que Dylan Roof buscasse arrependimento para que ele pudesse estar melhor do que ele está agora.
Eu firmemente creio que precisamos ser precisos em nossa teologia. Hereges e heróis da fé frequentemente têm discordado sobre importantes doutrinas baseados em uma letra de uma palavra (homoousios vs. homoiousios).
É fácil para o “teólogo” selecionar as palavras deles e argumentar que verdadeiro perdão sempre envolve arrependimento e, portanto, leva a restauração. Afinal, nós devemos perdoar uns aos outros de acordo com a maneira que Deus em Cristo nos perdoou (Ef 4.32). Mas eu temo que tal atitude é do tipo que tem mais em comum com alguém assentado em uma torre de marfim que alguém que entende o luto.
Eu ainda mantenho que o que testemunhei nos parentes das vítimas foi teologia em ação que deveria nos humilhar até o íntimo do nosso ser.
Nós estamos todos cientes, eu acredito, que todos os pecados são cometidos contra Deus. Portanto, ninguém pode perdoar pecados da maneira que Deus perdoa. Ele tem uma autoridade particular que nós não temos. Todos os pecados são cometidos contra Deus, imediatamente ou não. Às vezes, o próximo é o meio, mas o pecado ainda é contra Deus. Por que isso é importante? Porque se nós perdoamos nosso próximo, isso não se relaciona com a culpa de seu pecado, mas ao dano que foi feito contra nós.
Assim, quando os familiares dos mortos “perdoaram” Dylan Roof, não estamos forçados a examinar seu perdão e, então, argumentar que eles não têm direito de fazê-lo porque não há arrependimento do Sr. Roof. Pelo contrário, nós devemos entender a oferta de perdão como baseada no dano que foi feito a eles por causa da perda que eles experimentaram.
De fato, eles não estão contando ao Sr. Roof que ele agora está justificado diante de Deus. Eles estão dizendo: você nos prejudicou e nos feriu; e nós perdoamos você por esse mal.
Eu notei que uma pessoa no Twitter sugeriu que os familiares poderiam ter dito isto:
“Eu não tenho a autoridade para perdoá-lo por assassinato. Somente Deus tem. Arrependa-se e volte-se para Jesus como Senhor e Salvador. Da minha parte, eu oro por sua conversão, e por justiça, e se você confessar e pedir isso, eu estou pronto a perdoar”.
Ora, isso soa bem, mas assume que não podemos perdoar pelo mal causado a nós. A distinção entre culpa e dano é uma distinção importante. Além disso, é muito tranquilo fazer essas sugestões de o que eles deveriam ter dito enquanto estamos sentados num computador, mas uma coisa bastante diferente é estar diante do assassino de alguém que você ama e oferecer-lhe Berkhof.
Eles fizeram o que suas almas, auxiliadas pela graça de Cristo, lhes permitiram fazer naquele momento. E eu acho que em vez de criticar essas pessoas, nós deveríamos nos sentir constrangidos pela maneira como eles falaram. Isso faz os reformados parecerem mesquinhos e pastoralmente insensíveis.
A questão da culpa de Dylan Roof permanece. Ele precisa se arrepender diante dessas pessoas e diante de Deus se ele vai ser salvo. Um dos familiares deixou claro:
“Mas nós gostaríamos que você usasse essa oportunidade para arrepender-se. Arrependa-se, confesse, entregue sua vida àquele que mais importa: Cristo. Que ele possa mudar isso, mudar seus caminhos, não importa o que aconteceu com você, e você estará bem. Faça isso e você estará melhor do que está nesse momento”.
Todos nós deveríamos ter em mente que seria glorioso se os mortos encontrassem Dylan no céu e o abraçassem. Eu posso orar para que a justiça seja feita a ele (i.e., que ele seja executado por esses assassinatos), mas que a misericórdia seja demonstrada a ele (i.e., que ele se arrependa e seja salvo).
Mas, seja o que fizermos, não lancemos dúvidas ou sombras sobre essas pessoas porque queremos usar essa oportunidade para criticar os detalhes de suas teologias. Precisão teológica tem seu lugar, e há alguns exemplos onde acho que precisamos insistir sobre arrependimento para reconciliação no contexto da igreja (i.e., “se teu irmão pecar…”). Mas este é um exemplo em que cristãos – e, de fato, não-cristãos também – somente podem se maravilhar com a graça e o amor que foram expressos por esses parentes enlutados.
Imagine se nós disséssemos ao mundo que o que eles viram dos familiares enlutados era teologicamente incorreto. E, baseado em Marcos 11.25, eu não tenho certeza de que eles estão teologicamente incorretos.
Os familiares das vítimas de Charleston expressaram um dos melhores exemplos de teologia que ouvi em minha vida. Pensar que as vítimas fizeram melhor em ir ao estudo bíblico do que em não ir é uma reflexão gloriosa e contundente para todos nós. João 17.24: “Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo”.