Lições do Salvador na manjedoura

Daniel Clifford

Grandes eventos pedem grandes celebrações – festas, comidas, balões, serpentinas, matracas. Contudo, quando Deus enviou seu Filho para nascer em Belém, ele chegou com muito menos celebração na terra do que poderíamos esperar. De fato, muitas das circunstâncias do nascimento de Jesus, como registrado em Lucas 2, foram lamentáveis. O que Deus quer que aprendamos desse envio de seu Filho que ocorreu de forma inesperadamente humilde? Aqui vão três lições vindas da manjedoura.

Primeiro, enviando Jesus em uma condição tão modesta, Deus nos lembra de nossa extrema necessidade. Jesus veio em humildade porque se colocou no lugar de pessoas que foram abatidas pelo pecado. O povo de Deus precisa de um lembrete de humildade sempre que Deus o visita, pois podemos ser tentados a pensar que somos o máximo por causa da misericórdia de Deus. Por exemplo, quando Deus apareceu a Abraão, prometeu abençoá-lo e fazer dele uma grande nação. O povo de Israel deveria se assombrar e se humilhar diante dessas promessas; em vez disso, as pessoas se gabavam que eram filhos de Abraão (Lc 3.8). De forma similar, nós ocasionalmente sentimos que gratificamos a Deus pela nossa adoração ou pelas boas ações, transformando a graça em motivo para nos gabarmos. Entretanto, ao considerarmos o Salvador na manjedoura, isto lembra que o nascimento de Jesus era todo sobre a condescendência de Deus, e não sobre o nosso merecimento.

A Virgem Maria, que aos olhos do mundo era socialmente desconhecida, entendeu isso. Quando ela contemplou a maneira como Deus a escolheu para ser a mãe do Messias, entendeu que a escolha de Deus era menos uma declaração de suas qualificações e mais uma declaração sobre quem ele estava salvando. A criança em seu interior encarnava a misericórdia de Deus para os humildes e o seu repúdio ao orgulho. Então Maria regozijou porque Deus “Encheu de bens os famintos e despediu vazios os ricos” (Lc 1:53).

Saber que Deus estava trazendo um Salvador para os humildes e abatidos deve ter ajudado Maria e José a perseverarem em meio às provações enviadas por Deus enquanto estavam em Belém. O que se pode dizer é: ninguém os ajudou quando chegaram à cidade. Nenhum parente de José os acolheu. Ninguém na cidade foi hospitaleiro, embora Deus tenha ordenado a Israel que cuidasse de peregrinos. Não houve alguém que os acomodasse na hospedaria. Jesus chegava como uma peça de um quebra-cabeça que não se encaixava em nenhum lugar – exceto em uma manjedoura.

Reflita a respeito da humildade inerente à manjedoura. A maioria das cenas do nascimento de Jesus retrata que a manjedoura se encontrava em um estábulo, no meio de pilhas de feno e de animais adoráveis e limpos. Contudo, muito provavelmente o local estava abarrotado, sujo e malcheiroso. Maria teve de dar à luz nessas condições! Ela envolveu o bebê com panos e o deitou em um cocho. A situação toda foi extremamente tosca e grosseira – a recepção, o nascimento e o berço.

Por quê? Deus enviou seu Filho “com diversas circunstâncias de humilhação fora do comum” (Catecismo Maior, 47) para nos mostrar quão baixo ele se inclinou para nos salvar! Isso reflete a grande bondade do Senhor e a nossa grande necessidade.

O GRANDE PODER DE DEUS

Segundo, Deus enviou Jesus em humildade para nos mostrar que a salvação é desenvolvida mediante o seu poder, e não por mera força humana Quando Deus enviou seu Filho ao mundo, ele se empenhou para evitar um aspecto que fornecesse credenciais messiânicas a Cristo ou que permitisse outro, além de Deus, o legitimar. Os anjos anunciaram a Cristo – mas imediatamente voltaram para os céus. Os pastores testemunharam de Cristo – mas a influência deles não levou o depoimento até Belém. Os magos adoraram a Cristo – mas Deus disse a eles que retornassem ao seu país de origem por outro caminho. Ana e Simeão acolheram a Cristo – mas eles não eram figuras influentes. O fato é que nenhuma instituição política ou religiosa jamais esteve por trás de Jesus, tanto em seu nascimento quanto durante o seu ministério.

É verdade que um homem muito poderoso, César Augusto, surgiu na história. Ele publicou um decreto para que todas as pessoas no mundo conhecido fossem registradas (Lc 2.1). Isso sim é poder! No entanto, Deus apenas se utiliza de César para levar Maria e José até Belém, a fim de que Jesus nascesse na cidade predita por Miqueias 5.2. César, com todo o seu poder, apenas funcionou para levar o plano de Deus adiante. O bebê recém-nascido na manjedoura encarna muito mais poder que o maior dos decretos de César. O poder de Deus, revelado em um frágil bebê, nos lembra de que o reino de Cristo não requer uma validação humana e não avança com esforços humanos.

Isso se aplica ao modo como planejamos o nosso trabalho na igreja. Eu suspeito que Deus abençoou a sua igreja com uma ordem bíblica de adoração, pregação e bons padrões doutrinários. Nossas igrejas também podem desfrutar de programas eficazes, edifícios bonitos e uma receita toda azul. Isso são bênçãos, mas Deus não conta com nenhuma dessas coisas mais do que contou com o decreto de César. Certamente nós tentamos servir a Deus com fidelidade, mas o trabalho dele não depende de nossos melhores esforços. O trabalho na igreja baseia-se inteiramente em seu poder e graça.

O mesmo se aplica à nossa vida cristã. Talvez seu encorajamento espiritual vacile consideravelmente, baseado em sua percepção sobre sua santidade pessoal. Em certo sentido, isso é natural, porque os cristãos amam o Salvador e se sentem felizes quando o agradam. Por outro lado, altos e baixos extremos podem vir, em parte, de uma percepção inadequada da grandeza do nosso Rei. Nós realmente acreditamos que nossa salvação depende dele e que ele é plenamente capaz de realizá-la?

Mais uma vez, considere a cena da manjedoura: Cristo como um bebê já era maior que o maior governador do mundo! Ele é o rei de Deus. Jesus é o centro e o poder da igreja – humilhado por nossos pecados em sua encarnação e, agora, ressuscitado dos mortos e derramando seu Espírito Santo sobre nós. A igreja existe por intermédio do seu poder e para a sua glória. Congregações individuais podem prosperar ou decair. A vitalidade espiritual pessoal pode subir ou descer. Todavia, Jesus Cristo é o mesmo Salvador ontem, hoje e sempre. Seu trabalho não depende de nosso poder; e sim, é nosso privilégio participar do seu reino. Quanto melhor compreendemos isso, mais alegria e liberdade serão entregues no nosso serviço na igreja! O trabalho é dele. Esta é outra mensagem da manjedoura.

A COMUNHÃO DE DEUS COM OS HUMILDES

Uma última mensagem da manjedoura é que Deus não hesita em entrar nos lugares e comungar com pessoas que parecem inferiores aos olhos do mundo. Jesus veio para que até mesmo “o menor desses” possa ter esperança.

O mundo classifica as pessoas de acordo com o respeito e admiração que elas adquirem. Aos olhos do mundo, grandes jogadores, como César, são muito importantes. Camponeses, pastores e aldeões são considerados sujos, pobres e ignorantes demais para receberem muita atenção. No entanto, Deus gosta de usar um pequeno palco para fazer um grande show. Em Belém, Deus entrou em um lugar pouco notável e o tornou extraordinário por sua presença salvadora. Ele esteve em comunhão com os humildes e os ergueu à grandeza através do seu favor.

Considere a condição de sua vida. Em última instância, não importa se ela parece significativa em termos mundanos. O verdadeiro significado da sua vida flui a partir de sua conexão à vida de Jesus. Se Deus te uniu a Jesus pela fé, então ele está fazendo algo grandioso em você. O Espírito Santo silenciosamente aplica os benefícios de Jesus Cristo em você. Ele continua a te apontar o amor de Cristo e a te ensinar a obedecê-lo. Ele garante que você é um filho de Deus. Ele te dá propósito na vida. Ele assegura o seu progresso rumo à glória. O que pode ser maior que o poder de Deus trabalhando em você?

De forma similar, a grandeza da obra salvadora de Deus nos dá esperança em meio às desordens, complexidades e decepções da vida. No estábulo, ninguém realmente tinha uma auréola em torno da cabeça (apesar dos cartões de Natal!). Maria e José chegaram àquele local por causa de rejeição e contratempos. A cena da manjedoura capta algo que é real da vida em um mundo caído. Alegria se mistura com privação. Promessa se mistura com bagunça. Ainda assim, em Belém, é Jesus quem entra em cena para cumprir a promessa e para providenciar a alegria em meio a uma situação que, em outro caso, seria triste e imperceptível.

Nós servimos a esse mesmo Salvador, e, portanto, não devemos ficar desencorajados quando a vida parece difícil, confusa ou deficiente de glória exterior. Nunca devemos dizer: “Minha vida não é importante o bastante para ser usada por Jesus.” Ou “Algo deve estar errado porque minhas experiências espirituais não são muito dramáticas.” Ou “Minha vida é muito confusa para glorificar a Deus.” Quando pensamos sobre como Jesus nasceu num estábulo, na companhia de pessoas humildes, percebemos que Deus não evita as bagunças. O Seu trabalho não depende de nossas qualificações, e sim de sua graça.

Jesus vem diretamente às vidas confusas. A todos que se arrependem de seus pecados e acreditam nele, vem com uma promessa de acabar com a bagunça, com a culpa, e com o medo da morte e do julgamento. Ele vem para nos restaurar com Deus e para nos levar ao seu reino. Esta é a maior lição da manjedoura.