Você já ouviu falar do Novo Evangelho? Ele não foi sistematizado. Não pertence a nenhuma pessoa ou movimento. Mas está cada vez mais popular.
O Novo Evangelho é, normalmente, composto de quatro partes.
Normalmente começa com um pedido de desculpas: “Me perdoe pelos meus companheiros cristãos. Eu entendo o porquê de você odiar o Cristianismo. É como Ghandi falou, ‘porque os cristãos não se parecem mais com seu Cristo? ’. Cristãos são hipócritas, julgadores e moralistas. Eu sei que mandamos mal com as Cruzadas medievais, a escravidão e as caças as Bruxas. Tudo que eu posso dizer é: perdoe-me. Não te demos razão para crer.”
Então há o apelo a Deus como amor: “Eu sei que você já viu aqueles pregadores com cartazes e megafones gritando ‘Arrependa-se ou vá para o inferno’. Mas eu estou aqui para te dizer que Deus é amor. Veja Jesus – ele andou com prostitutas e coletores de impostos. Ele amou incondicionalmente. Há muito sofrimento no mundo, mas as boas novas da Bíblia é que Deus veio ao mundo viver em meio ao nosso sofrimento. Ele é um Deus carinhoso e seu alvo é o amor. ‘Eu não vim ao mundo para condená-lo’, foi o que Jesus disse (João 3.17). Ele amou a todos, não importa quem você fosse ou que tivesse feito. E foi isso que o levou a ser assassinado.”
A terceira parte do Novo Evangelho é um convite para se juntar a Deus em sua missão no mundo: “É uma vergonha que os cristãos não tenham mostrado esse Deus ao mundo. Mas é isso que nós fomos chamados para fazer. O reino de Deus está sendo estabelecido na Terra. Na Terra! Não em um céu longínquo depois que morrermos, mas aqui e agora. Mesmo que nós aprontemos, somos agentes de Deus para espalhar seu amor e trazer seu reino. E não o fazemos assustando as pessoas com linguagem religiosa ou forçá-los a se encaixar em um tipo de perfil religioso. Nós o fazemos por meio do amor. Esse foi o caminho de Jesus. É isso que significa segui-lo. Nós amamos nossa vizinhança e amamos trabalhar pela paz e pela justiça. Deus quer que sejamos as boas notícias para um mundo perturbado.”
Finalmente, há uma ambigüidade estudada em relação à eternidade: “Não me entenda mal, eu acredito sim na vida após a morte. Mas nosso foco deve ser no tipo de vida que vamos viver aqui e agora. Algumas pessoas irão para o inferno quando morrerem? Quem sou eu pra dizer? Deus realmente requer um tipo certo de oração ou de declaração de fé para chegar ao céu? Eu não sei, mas acho que posso deixar isso nas mãos dele. Meu dever não é julgar as pessoas, mas abençoá-las. No fim das contas, a maravilhosa graça de Deus pode nos surpreender. E certamente é nisso que eu tenho esperanças.”
Porque é tão legal?
Essa forma de falar sobre as boas novas de Deus é muito chique. É popular por diversas razões.
- É parcialmente verdade. Deus é amor. O reino já chegou. Cristãos podem ser estúpidos. As particularidades do Novo Evangelho normalmente são justificáveis.
- Lida com caricaturas. Os vilões são os pregadores explosivos das ruas, os Cruzados, e imagens caricatas da visão evangélica da salvação.
- O Novo Evangelho leva as pessoas a acreditar em coisas erradas sem explicitamente afirmar essas coisas erradas. Isso é, cristãos que abraçam o Novo Evangelho se sentem a salvo de críticas porque ele nunca realmente disseram que fé não é importante, que não existe inferno, que Jesus não é o único caminho, que Deus não se ira, ou que não há necessidade de arrependimento. Essas distorções não estão explícitas, mas o Novo Evangelho é apresentado de tal forma que os não-crentes podem, e devem, chegar a essas conclusões. Em outras palavras, o Novo Evangelho permite que os não-cristãos ouçam o que querem ouvir enquanto se protegem das críticas de outros cristãos. O pregador do Novo Evangelho sempre tem a opção de, quando confrontado, dizer: “Mas eu nunca disse que não acredito nessas coisas.”
- Ele é maleável. O Novo Evangelho encontra as pessoas onde elas estão e as deixa lá. Ele apela ao amor e a ajuda aos pobres. E faz esse apelo de uma forma que repudia qualquer ponta de julgamento, intolerância ou religiosidade. Isso está destinado a ser popular. Ele nos diz que queremos ouvir e nos dá algo que conseguimos fazer.
- O Novo Evangelho é inspirador. É isso que faz a mensagem tão atraente para os jovens em particular. Eles sentem a emoção e o propósito de ser parte de uma grande causa, sem toda aquela bagagem da história, da doutrina e das partes complicadas da Igreja. Quem não vai querer participar de uma revolução amorosa?
- O Novo Evangelho não te traz nenhuma ofensa. É por isso que a mensagem tem tanto apelo. Os vilões estão “lá fora”. E isso pode ser um problema para qualquer um de nós. Todos nós estamos propensos a “maquiar” o Evangelho, apresentando apenas as partes atraentes e deixando de mencionar os pontos aonde Cristo não só nos conforta, mas nos confronta. E ele nos confronta mais que os pecados dos outros. É muito fácil usar o Novo Evangelho para se diferenciar de todos os maus cristãos. Isso faz com que você pareça melhor e confirma aos não-cristãos que o obstáculo de seu comprometimento está na hipocrisia e fracasso dos outros. Não se fala em arrependimento ou julgamento. Não há nada sobre a causa da morte de Jesus: nem tanto por conta de seu amor, mas por falar sobre sua divindade (Mateus 26.63-66; 27.39-43). O Novo Evangelho só fala de salvação em termos cósmicos. Na verdade, a porta é deixada aberta para o pensamento de que o inferno, se é que ele existe, provavelmente não é uma grande ameaça às pessoas.
Porque é tão errado?
Não deveria ser difícil de enxergar o que está faltando no novo evangelho. O que está faltando é o antigo evangelho, o que era pregado pelos Apóstolos; aquele definido em 1 Coríntios 15 e resumido mais tarde no Credo Apostólico.
“Mas isso que você chama de Novo Evangelho não é um substituto para o antigo evangelho. Nós acreditamos em todas aquelas coisas.”
Ok, então porque vocês não falam isso? E não só aos seus amigos íntimos ou em uma declaração de fé qualquer, mas em público? Você não precisa ser mau, mas precisa ser mais claro. Você não precisa descarregar todo o caminhão da teologia sistemática sobre alguém, mas deixar a impressão de que o inferno não é grande coisa é o contrário do que Jesus fez (Mateus 10.26-33). E quando você não fala sobre a necessidade de fé ou arrependimento, você está indo totalmente contra os Apóstolos (Atos 2.38; 16.31).
“Mas estamos apenas construindo pontes. Nós nos relacionamos com a cultura, primeiro, falando em uma linguagem que eles entendem, apresentando as partes do Evangelho que fazem mais sentido pra eles. Quando conseguimos prender sua atenção e conquistar sua confiança, passamos para o discipulado e ensinamos sobre pecado, arrependimento, fé e todo o resto. Isso é apenas pré-evangelismo.”
Sim, é verdade, nós não precisamos começar as nossas conversas onde nós queremos chegar. Mas o Novo Evangelho realmente incentiva o evangelismo, ou apenas leva o não-cristão a uma falsa segurança? Uma coisa é abrir a porta para outras conversas. Outra é fazer o cristianismo tão palatável que soa como algo que o não-cristão já faz. Isso partindo do melhor do Novo Evangelho, que lá no fundo ele é apenas o desejo de propagar o antigo evangelho.
A abordagem de Paulo com os não-cristãos em Atenas é instrutiva nesse sentido (Atos 17.16-34). Primeiro, Paulo provocou os atenienses ao falar que a cidade tinha muitos ídolos (16). Sua pregação não é guiada pelo seu desapontamento com outros cristãos, mas com sua ira contra a descrença. Em seguida, ele obtém permissão para falar (19-20). Paulo não atacou as pessoas. Ele falou para aqueles que estavam dispostos a ouvir. Mas veja o que ele faz: cria uma conexão cultural (22-23, 28), mas daí ele mostra o contraste entre o entendimento ateniense de Deus e como Deus realmente é (24-29). Sua mensagem não é sobre um estilo de vida, mas sobre adorar ao Deus verdadeiro da forma correta. Depois disso, ele clama por arrependimento (30), alerta sobre julgamento (31), e fala da ressurreição de Cristo (31).
O resultado é que alguns zombaram dele (32). Que pessoa no mundo zombaria do Novo Evangelho? Não há nada nele para não gostar. Não é escândalo em uma mensagem sobre cristãos patéticos, um Deus de amor, mudar o mundo, e como a maioria de nós provavelmente não irá para o inferno. Nunca zombarão dessa mensagem, mas o discurso de Paulo no Areópago foi zombado. E lembre-se, essa pregação em Atenas foi apenas uma introdução à mensagem cristã. Era apenas o começo, a partir de onde alguns quiseram ouvi-lo novamente (32). Paulo falou mais em sua introdução do que muitos cristãos jamais se atreverão a falar. E talvez não sejamos capazes de dizer tudo que Paulo disse em Atenas de uma vez só, mas nós certamente não deveríamos dar a impressão em nosso “pré-evangelismo” que arrependimento, julgamento, a necessidade da fé, a importância dos dogmas corretos, a centralidade da cruz e da ressurreição, a pecaminosidade e Queda do homem – as coisas que alguns sugerem ser o verdadeiro evangelismo – são velharias ultrapassadas de um cristianismo mal-intencionado e doloroso.
Um apelo final
Por favor, se você está interessado pelo Novo Evangelho ou alguma coisa parecida, repense se você está sendo justo com seus companheiros cristãos ao jogá-los todos no mesmo saco de farinha. Pense se você está pregando como Jesus pregou, chamando pessoas não para um estilo de vida, mas para o arrependimento e para a fé (Marcos 1.15). E assim como eu e meus amigos refletimos se temos ou não a paciência e a humildade necessárias para falar amavelmente com não-cristãos, reflita se o seu Deus é uma caricatura cartunesca de um Deus que nunca se ofende com o pecado (saiba que pecado é mais que não ser simpático com seus vizinhos) e nunca derrama sua ira (exceto para seu julgamento sobre aqueles que julgam demais). Pense se você está dando a atenção devida à cruz e ao Cordeiro de Deus que morreu nela para tirar o pecado do mundo. Reflita se a sua explicação da mensagem cristã soa com o que os Apóstolos pregavam ao mundo no livro de Atos.
Isso não é uma coisa pequena. E não é apenas um problema de ênfase. O Novo Evangelho não vai sustentar a igreja. Ele não é capaz de mudar os corações. E ele não salva. É crucial, portanto, que nossas escolas, conferências e editoras cristãs, e igrejas, possam discernir o Novo Evangelho do Antigo.
Traduzido por Filipe Schulz | iPródigo