Muitas vezes, quando se fala de santidade como requisito para que alguém veja o Senhor, alguns tentam se esconder debaixo da graça de Deus. “Não somos salvos pela santificação, mas pelo amor divino!”, dizem. Prova disso é o criminoso da cruz, que viveu uma vida de pecado e impiedade, mas teve seu lugar no paraíso garantido por Jesus. O que ele fez? Nada que merecesse a salvação. Foi atraído pelo Salvador que estava ao seu lado, clamou por misericórdia e a recebeu. Logo, sem santificação, alguns verão ao Senhor.
O amor de Deus cobre nossos pecados, e sabemos que não são nossas ações que garantirão nossa salvação eterna. Tanto o pior dos pecadores quanto o maior dos missionários são nada diante da perfeita justiça de Deus. Tanto o estuprador serial quanto Francisco de Assis nasceram já carentes da misericórdia de Deus. É a obra de Cristo que garante tudo o que eles e nós precisamos.
Mas, ainda assim, temos o famoso verso de Hebreus 12.14: “Sem santificação, ninguém verá o Senhor”. Sim, esse verso está lá e não deveríamos ignorá-lo. O mais conveniente seria apenas considerá-lo como uma parte da teologia do autor de Hebreus, que nada tem a ver com a graça maravilhosa de Paulo e Jesus. Mas não acredito que temos essa opção. Para o cristão, a santificação não é opcional, mas um processo necessário.
E o ladrão na cruz?
O ladrão da cruz viveu sua vida de qualquer maneira e apenas se converteu no fim. Isso significa que Deus não exige que alguém tenha levado uma vida de santidade para levá-lo ao paraíso? Eu, porém, digo que existem alguns motivos para não colocarmos a esperança na situação do “bom ladrão”.
Primeiro, o ladrão é um caso excepcional. A vida dele não pode ser a base para a nossa. Provavelmente ninguém que esteja lendo esse texto, neste momento, está no leito de morte tomando uma decisão de última hora. Quem defende a tese do ladrão da cruz para justificar uma vida sem piedade ignora que a maioria dos crentes não se converteu com poucas horas restantes de vida. Todos que estamos em igrejas conhecemos e ouvimos a mensagem de Jesus há algum tempo, e isso nos dá a responsabilidade e o dever de, após nossa conversão, colocar em prática sua mensagem enquanto estivermos vivos. Não vimos um crescimento em Deus na vida do ladrão na cruz como nos é exigido porque não houve tempo para isso.
Segundo, o ladrão da cruz não morreu instantaneamente após entregar-se a Jesus. Ele deve ter passado pelo menos umas duas horas com um prego enfiado nas mãos sustentando seu próprio corpo. A Bíblia não nos conta nada mais sobre ele, mas imagino que ele continuou sofrendo aquela tortura sem murmurar ou xingar. Se murmurou, a presença do silencioso Salvador ao seu lado deve ter lhe levado ao arrependimento. Ele viveu uma curta, mas real vida de santidade.
Terceiro, geralmente (preste atenção no geralmente) as pessoas morrem como vivem. É muito arriscado colocar sua esperança numa conversão de última hora. Talvez passe pela cabeça de alguém a seguinte ideia: “não vivo uma vida de santidade. Se eu não for crente, quem sabe mais velho eu mude ideia”. Isso é um erro gravíssimo. Lembre-se: quanto mais o pecado é ignorado, mais sua consciência tornar-se-á insensível a ele. Quanto mais você ouve a mensagem do Evangelho sem ouvidos para ouvi-la, mais duro se tornará seu coração.
Quem pensa que continuará ignorando Deus até o último momento, ou até que seja um pouco mais velho, mais rico, ou casado (pois antes disso sempre há um restinho de vida pra aproveitar) talvez nunca deixe de ignorar a Deus. Portanto, viva como se Jesus fosse voltar amanhã. Não tente achar um alvo para então buscar a santidade que está em Cristo. Busque agora!
Ninguém deve esperar viver a vida como aqueles personagens que se convertem de última hora. Todos nós devemos entender que, sem passarmos por um processo de santificação, dificilmente poderemos chegar no último dia e considerar-nos salvos. Não estou dizendo que nossa salvação vem por obras. Estou dizendo que nossa salvação não vem sem obras. Não existe pessoa meia-salva por Jesus. Quando você é regenerado e justificado por Cristo, automaticamente entra em um processo de santificação. E assim aconteceu com o ladrão da cruz.
O Espírito provoca isso em você, para que você se assemelhe mais a Jesus. Também não quero dizer também que nos tornamos impecáveis. Pelo contrário, uma das marcas da vida piedosa é a série de lutas contra o mal que habita em nós, contra as tentações do diabo e contra a proposta de vida mundana. A vida é uma guerra e, em um relacionamento com Deus, precisamos muitas vezes vencer batalhas duras. Lembre-se de como Jesus promete às sete igrejas a glória eterna: “ao vencedor”. Talvez não saibamos exatamente o que ele considera como vitória contra o mundo, a carne e o diabo, mas certamente não vence aquele que desiste no meio da batalha ou aquele que espera trocar de lado na hora da derrota eminente de seu exército.
Santificação e vida futura
Existem na Bíblia textos que muitos de nós gostaríamos de ignorar, e acredito que este de Hebreus 12.14 é um deles. Queremos fingir que ele não diz o que ele diz. Gritamos: “não, mas a salvação é pela graça!”. E de fato é! Mas é também a própria graça e a gratidão por ela que produz os atos que te levarão a uma aprovação neste último julgamento:
“Os que fizeram o bem ressuscitarão para a vida, e os que fizeram o mal ressuscitarão para serem condenados.” (Jo 5.29)
“Pois todos nós devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba de acordo com as obras praticadas por meio do corpo, quer sejam boas quer sejam más.” (2Co 5.10)
Tomemos cuidado se gostamos de ignorar certos versos com a desculpa de que a graça de Deus cobre tudo. Esses atos que serão julgados não são a base da nossa salvação, mas são evidências dela. Quem já viu algum filme de julgamento sabe como é isso. Existem evidências que um advogado apresenta a fim de provar o ponto dele. Quais são as evidências de sua salvação? John Piper nos explica:
Pela graça somos salvos, mediante a fé, e não vem de nós mesmos, é dom de Deus. Mas o coração que está cheio de fé transbordará de atitudes e ações muito diferentes das que fluem do incrédulo. Portanto, nossas ações vão testemunhar verdadeiramente a autenticidade ou a ausência de fé, e não é incoerente que Deus nos julgue segundo as nossas obras. Temos de compreender que esse juízo de acordo com obras não significa que nós ganhamos a nossa salvação. Nossos atos não ganham a salvação, eles a exibem. Nossas ações não são o mérito da nossa justiça, são a marca da nossa vida nova em Cristo. Nossas ações não são suficientes para merecer o favor de Deus, mas elas de fato demonstram nossa fé. Por favor, mantenha a distinção clara em sua mente a respeito de nossas atitudes e ações: eles não ganham, eles exibem; elas não merecem, elas evidenciam. E, portanto, “Deus retribuirá a cada um segundo as suas obras”, incluindo os cristãos.
Em seu livro Santidade, J.C. Ryle levanta uma questão interessante, que sempre tento trazer em minha mente. Ele nos pergunta: se você não busca a santidade aqui, o que você quer com o céu? Nossa atitude em relação às coisas celestiais aqui na terra diz muito sobre qual é nosso interesse na vida futura. Se aqui não nos sentimos à vontade em nenhuma igreja, não gostamos de cantar, não gostamos de orar, não gostamos de ler a Bíblia, não valorizamos a importância de uma mente purificada, não sentimos prazer em conversas que produzem crescimento espiritual, o que queremos no céu? O pastor inglês John Owen nos fala sobre esse tipo de atitude: “Pessoas assim nem desfrutariam da presença de Deus, e nem Deus seria uma recompensa para elas”.
Veja: não estou dizendo para não nos relacionarmos com incrédulos ou irmãos fracos. Estou dizendo que, quando crescemos no Senhor, passamos a apreciar cada vez mais o fruto do Espírito em nossas vidas e na vida dos outros. Não é que passamos a menosprezar certas pessoas e certas realidades, mas que passamos a apreciar mais os servos de Cristo e o fruto da graça em suas vidas.
Santificação e temor
Talvez você diga: “não, eu não gosto de estar no meio de pessoas santas” – mas na vida futura encontraremos o quê? “Tenho preguiça de ler a Bíblia” – mas se somos incapazes de se concentrar pra ouvir o que Deus falou e fez, o que queremos lá? Qual é nosso interesse? Escapar do inferno? Talvez você pense: “você quer que as pessoas procurem a santidade por medo?”. Não é o que eu quero. Mas, às vezes é necessário que sejamos alertados quanto a isso. Jesus nos diz:
“Eu lhes digo, meus amigos: Não tenham medo dos que matam o corpo e depois nada mais podem fazer. Mas eu lhes mostrarei a quem vocês devem temer: temam aquele que, depois de matar o corpo, tem poder para lançar no inferno. Sim, eu lhes digo, esse vocês devem temer.” (Lc 12.4,5)
“Ou vocês pensam que aqueles dezoito que morreram, quando caiu sobre eles a torre de Siloé, eram mais culpados do que todos os outros habitantes de Jerusalém? Eu lhes digo que não! Mas se não se arrependerem, todos vocês também perecerão”.” (Lc 13.4,5)
Esses textos estão dizendo exatamente o que eles estão dizendo: tenham medo de levar uma vida mais ou menos, tenham medo de ir para o inferno. Se vocês não conseguem fazer o que é bom por obediência, gratidão e amor a Deus, então façam pelo temor. Somente aquele que entrou na guerra contra o pecado verá o Senhor. Deus nos chamou para viver uma eternidade em santidade. Mas esse processo começa agora. Ele só se completará no céu, mas ele começou aqui. Pense nisso, lute por isso. Sem santificação ninguém verá o Senhor.
Você quer ver o Senhor? Então dedique-se a ele cada dia mais!
Considere a necessidade de santidade. É impossível que você seja a menos que seja santo. Se não houve santidade aqui, não haverá felicidade na ida por vir… Oh, senhores, não enganem a sua própria alma! A santidade é absolutamente necessária; sem ela, vocês jamais verão o Senhor. Não é absolutamente necessário que você seja importante ou rico neste mundo, mas é absolutamente necessário que seja santo; não é absolutamente necessário que você tenha saúde, força, amigos, liberdade, vida; mas é absolutamente necessário que seja santo. Um homem poderá ver o Senhor sem que tenha prosperidade terrena, mas ele jamais verá o Senhor, a menos que seja santo. Um homem pode ir ao céu, para a felicidade, sem que tenha honras e glórias terrenas, mas jamais poderá ir para o céu, para a felicidade, sem santidade. Se não houver santidade aqui, não haverá céu na vida futura. (Thomas Brooks, Londres, 1662)
Aguardando ansiosamente o nosso encontro com o Senhor,
Josaías Jr.